terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

DE PORTUGAL...(artigo parcial)


ENTREVISTA
Stuart Holland: “Este é ‘o’ momento de viragem da Europa”


PAULO PENA

08/02/2015 - 10:39


Amigo de Yanis Varoufakis, este ex-conselheiro de Jacques Delors e de António Guterres revela o que pode acontecer na cimeira extraordinária do Ecofin na próxima semana.“A Economia é um jogo de linguagem privada jogado por economistas profissionais com pouco ou nenhum respeito pelo mundo real” MIGUEL MANSO




14







TÓPICOS

Parlamento Europeu
Conselho Europeu
Europa
Alemanha
Reino Unido
Grécia
Rússia
China
Índia
Brasil
Angela Merkel
François Hollande
David Cameron
Jean-Claude Juncker
António Guterres
Jorge Sampaio
Eleições
Zona Euro
BCE
Dívida Pública
Wall Street
Vítor Constâncio
Coimbra
Educação
Conjuntura
Comissão Europeia
História
Berlim
Emmanuel Macron
Segunda Guerra Mundial
Yanis Varoufakis

MAIS
Varoufakis promete programa detalhado da Grécia


Stuart Holland, 75 anos, passou os últimos 30 anos a defender algo que agora pode impedir “a desagregação da Europa”. É um economista sui generis. Começou por estudar História e Ciência Política e só depois fez um doutoramento na ciência que domina os nossos dias. Holland é um perito em chancelarias.

Do número 10 de Downing Street, onde começou, como conselheiro de Harold Wilson, aos labirintos da Europa. Negociou com De Gaulle, escreveu memorandos para Helmut Kohl. Lembra como Guterres podia entrar isolado no Conselho Europeu e sair de lá com um voto unânime. Estas e outras memórias fazem parte do livro Europe in Question: and what to do about it, que acaba de publicar. No final, como anexo, inclui a última versão daModesta Proposta para solucionar a crise da zona Euro, que escreveu com o ministro grego das Finanças, Yanis Varoufakis, e com o economista americano James K. Galbraith. No próximo dia 12 vai estar em Londres, a debater com Vítor Constâncio, do BCE. Em Coimbra, onde reside há dez anos, e é professor visitante na Faculdade de Economia, vai organizar, entre 28 de Fevereiro e 28 de Março, um seminário chamado: Depois do êxito do Syriza.

No seu livro, bem como na Modesta Proposta… que assinou com Yanis Varoufakis, agora ministro na Grécia, argumenta que a Europa pode recuperar economicamente, na linha do New Deal de Roosevelt, sem que sejam criadas novas instituições, revistos os Tratados, nem ajudas dos países mais fortes. Como?
As instituições já existem. O Banco Europeu de Investimentos (BEI) e o Fundo Europeu de Investimentos, que eu sugeri quando aconselhava Jacques Delors [Presidente da Comissão Europeia] nos anos 90. Como? Através da emissão de obrigações. Como Roosevelt fez, para financiar os investimentos sociais e ambientais do New Deal que reduziram o desemprego, entre 1933 e a Segunda Guerra Mundial, de 25% para menos de 10%. E isto foi feito com um déficit orçamental médio de 3% - o limite de Maastricht…

Mas isso vai contra aquilo que a Alemanha tem defendido. Não acredita que Berlim pode bloquear essa proposta?
Não. Há um procedimento que não depende da unanimidade, na Europa, chama-se “cooperação reforçada”. A Alemanha usou-o recentemente para ultrapassar David Cameron quando propôs uma taxa sobre as transacções financeiras. Outros estados-membros que desejem recuperar economicamente podem usar este mecanismo, se necessário, para contornar a posição da Alemanha.

Poucos serão os políticos europeus, nesta altura, que tenham equacionado essa hipótese…
Jean-Claude Juncker, François Hollande e os seus ministros da Economia e das Finanças, Michel Sapin e Emmanuel Macron, Matteo Renzi e o seu ministro das Finanças, Pier Carlo Padoan, o ministro polaco das Finanças Mateusz Szczurek e, é claro, Yannis Varoufakis.

Mas ainda não os vimos agir, pois não?
O desrespeito da Alemanha pelas posições do Syriza e a necessidade de evitar uma Grexit [saída da Grécia do Euro] podem ser o catalisador.

Mas há um argumento de peso na posição alemã: Não se pode resolver uma crise de dívida aumentando o montante da dívida. Não concorda?
Os empréstimos do BEI não são contabilizados como dívida pública. Nem o seriam as obrigações emitidas pelo Fundo Europeu de Investimentos. Seria necessário que ambas as instituições funcionassem, neste plano, porque as regras do BEI apenas lhe permitem financiar metade dos projectos, sendo a outra metade da responsabilidade dos estados-membros. E os Estados sentem dificuldades para co-financiar projectos com o BEI desde que surgiu a crise na Zona Euro. O BEI tem também uma grande dependência, no financiamento das suas obrigações, de fundos de pensões, que são muito conservadores. Pelo contrário, o Fundo poderia emitir obrigações que reciclassem os excedentes financeiros, que é algo que os BRIC [Brasil, Rússia, Índia e China] querem. Em Dezembro, o ministro da Economia da África do Sul disse publicamente que se a Europa emitisse estes títulos, eles investiriam. No primeiro discurso de Juncker, no Parlamento Europeu, de 15 de Julho, das suas dez prioridades, a primeira era esta. Temos tido aliados importantes, há décadas, nesta proposta, incluindo Jacques Delors e António Guterres.

Quanto tempo trabalhou com Delors?
Depende como definir “trabalho” [risos]. Mas foi de 1975 até 1995. Fomos ambos conselheiros de primeiros-ministros e ambos nos demitimos, por acreditarmos em valores, o que não era uma coisa comum. Depois ele tinha-me pedido que desenhasse algumas políticas e instituições que contrariassem o pendor deflacionário das condições impostas em Maastricht sobre o déficit e a dívida. Eu recomendei-lhe o Fundo Europeu de Investimentos, que ele criou em 1994.

Depois, tornou-se num conselheiro externo de Guterres?
Sim. Eu só conheci Guterres quando ele foi eleito primeiro-ministro, mas a recomendação para que nos encontrássemos partiu de Jorge Sampaio, que eu conheço desde os anos 70. Os meus conselhos beneficiaram de trabalhar com o primeiro-ministro um assessor [diplomático] excepcional, o embaixador José Freitas Ferraz. Costumava ligar-me sempre, antes dos Conselhos Europeus, pedindo-me sugestões. Havia muitas, que Delors não conseguiu levar adiante. Aconselhei Guterres que devíamos clarificar o âmbito do BEI, que era vago, “o interesse geral da Europa”, para que investisse em projectos relacionados com Saúde, Educação, reconversão urbana, novas tecnologias e Ambiente. Tudo são áreas sociais, semelhantes às do New Deal de Roosevelt. Freitas Ferraz disse-me: “Stuart, renovação urbana… Nós vivemos em sociedades urbanas. Isso pode significar qualquer coisa, não é?” Era precisamente o que eu queria dizer [risos]. Exactamente, respondi. Nesta questão demorou três reuniões do Conselho para ganhar. Helmut Kohl [ex-chanceler alemão], opunha-se. Dizia que os contribuintes alemães já pagavam demais. Ou seja, não percebia que um título do BEI não seria pago pelos contribuintes alemães, e não precisa de transferências orçamentais da Alemanha. Freitas Ferraz sugeriu que devíamos escrever um memorando para Kohl. Eu sei algum alemão, mas não me atrevi. Escrevi em inglês e pedi para traduzirem. “Caro chanceler, aproxima-se o conselho de Amsterdão [Junho de 1997] e, sem dúvida, o primeiro-ministro português vai, mais uma vez, levantar a questão dos investimentos do BEI…” Kohl ac
eitou. 

Sem comentários:

Enviar um comentário