domingo, 31 de maio de 2009

TEIXEIRA DE PASCOAES


Afirma o próprio Teixeira de Pascoaes:” O génio da Língua é o dom especial que ela tem de traduzir o sentimento saudoso da Natureza animada e inanimada.” (in Arte de ser português”)


Este é um dos mais difíceis poetas portugueses; não vos escondo essa apreciação, mas como os amo a todos no espírito da Mensagem que me legaram, quero dar-vos um pouco dele, de modo simples e sem pretensões de intelectualidade…
A sua obra toca o SAUDOSISMO, o humanismo, a sensibilidade, o desdobramento da personalidade, uma certa atitude filosófica perante a existência, a Criação e o Panteísmo (crença em vários deuses ou divinização de certas entidades); mas Teixeira de Pascoaes demonstra, ainda, uma especial predilecção pela noite e pelo sonho, pela Saudade, sentimento tão português, provocado pelo afastamento, na distância…
Um exemplo de panteísmo podemos vê-lo no poema “Canção alegre”: “Eu te abençoo, alegria! / Alma e corpo da esperança!”onde a Alegria é endeusada pelo poeta que a abençoa, como sendo a raiz da vida.
No poema “A sombra do homem”, nota-se o humanismo, revelado pelas preocupações mais normais de qualquer ser humano: o sono, as trevas, o silêncio, o remorso, a exaltação, as interrogações do Ser …A certa altura, de tão preocupado, o poeta já se confunde com DEUS, com a NATUREZA, e afirma: Ó DEUS, tu és em mim, fragilidade;/ sombra que, por encanto, surge e passa…/ E nele, sou profunda Eternidade,/ Êxtase, Beatitude, Enlevo e Graça!/ Orar é a gente ver a DEUS em si/ E ver-se a gente em DEUS…”(…).
Mentor da revista literária “Renascença Portuguesa” a par de Jaime Cortesão e do filósofo Leonardo Coimbra, revista essa que, mais tarde, se aliou nos ideais, à segunda série da revista “Águia”, a ideia destes autores, eivados de Saudosismo, era a de dar sentido às energias intelectuais do povo português, no seu determinante e determinado caminho para a renovação do nosso país. No passado de Portugal, segundo o pensamento do poeta, estavam as fontes da nacionalidade que era preciso recuperar; por isso, a Saudade podia ser vista como “sangue espiritual” da raça portuguesa. E assim o afirma na revista “Águia”: “A Saudade é o próprio sangue espiritual da raça, o seu estigma divino, o seu perfil eterno. Claro que é a saudade no seu sentido profundo, verdadeiro, essencial (…) onde tudo o que existe, corpo e alma, dor e alegria, terra e céu, engrandecem um povo…”(in Dimensão Literária- Português A-Porto Editora, pág. 150/162, ISBN 972-0-40055-2).
No poema “ Aos Lusíadas” encontra-se uma prova desse portuguesismo, desse amor extremo por Portugal, em:”Ó Deus da minha Pátria, olhai por ela”/ Dai à sua bandeira nova glória/ Pregai, nas suas dobras, uma estrela! / Ó templo dos Jerónimos…/Ó Deus de Ourique! /…regresse o Dom Sebastião do nosso ser!”
Nota-se já, em TEIXEIRA de PASCOAES, uma amostra do que foi a fragmentação do “EU” em Fernando Pessoa e que o conduziu à criação dos célebres heterónimos, nos princípios do século XX.Veja-se essa verdade, no poema “O HOMEM”, 2ª estrofe: “ Sinto na minha vida várias vidas! / Sinto bem minha alma dividir-se/ Em muitas almas íntimas…” (…)
Teixeira de Pascoaes amava, como temos vindo a ver, a sua terra, a sua região e descreve, em tons de mestre, esse amor, num conhecido poema que foca, particularmente, a região do MARÃO e a que o poeta deu o nome “MARÁNOS”; muitas editoras escrevem “MARÂNUS”; mas, porque a grafia correcta é a do autor, é essa que usarei, neste trabalho. Ao longo deste poema, que é enorme, Pascoaes retrata o carácter de genuinidade das gentes da serra, a sua riqueza cultural multifacetada, a sua antiguidade na modernidade. Sugestivo nas Imagens, como por exemplo ao tratar a Saudade como “VIRGEM MÃE“, este poema é mais uma prova de que o SAUDOSISMO, movimento poético, é uma espécie de “religião da Saudade”, vivida pelo poeta e seus seguidores, num verdadeiro clima de Idealismo. Saudade era para PASCOAES o modo como Duarte Nunes de Leão a definia em “Origens da Língua Portuguesa”, tal qual é dito no livro “PORTUGUÊS A-12º ANO, da TEXTO EDITORA, da autoria de Mª Leonor Carvalhão Buescu e Carlos Ceia:”SAUDADE É LEMBRANÇA DE ALGUMA COISA COM DESEJO DELA…”
Algumas passagens desse poema revelam um tom profético, mostrando a serra como verdadeiro coração de Portugal, onde se mantêm várias origens da nossa Língua bem como usos, costumes e tradições que marcaram a portugalidade: ”Marános, esse amante da montanha/ Ouvira aquela voz e interpretava…o nosso” mundo-criatura”…mundo criador e ser humano/ Um céu verde, de flores esmaltado/ …No infinito silêncio e na infinita Soledade…/ E tinha, assim/ consciência… de outra existência trágica e sem fim/ (…) E, entre ele e aquela mística paisagem, /A névoa da distância dissipou-se. / Ela estava integrada em seu espírito, / Seu espírito esparso através dela// (… )”.
A SAUDADE, sentimento nosso, genuíno, sem tradução em Língua alguma, é um tema recorrente na nossa Literatura. Basta pensarmos nas Cantigas trovadorescas… Mas o próprio rei D. Duarte, filho de D. João I, falava da “SUIDADE”, no seu livro “LEAL CONSELHEIRO”…E que dizer de António Nobre que escreveu “ SÓ”, o livro mais saudoso de PORTUGAL?
Deixo-vos, leitores, com um pensamento simples de JOHN Le CARRÉ, escritor britânico:”Uma secretária é um sítio perigoso para observar o mundo…
VAMOS ,UM DIA DESTES, À SERRA DO MARÃO?

SÓ AGORA REPAREI QUE NÂO DISSE QUE ESTE TEXTO FOI, HÁ CERCA DE 15 DIAS,publicado no "Jornal de Mealhada",do qual sou uma "graciosa"colaboradora.

2 comentários:

  1. Não é um autor fácil...mas lido este texto, até diria que parece sê-lo, tal é a fluidez da escrita e a clareza das ideias.
    Certamente, neste momento, sei muito mais do que sabia antes.
    Obrigada!!!

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  2. Este texto foi refrescante.

    A maneira como cita para continuar a "caminhada" da sua exposição, fluente e cativante, faz-me sentir um estudante atento a uma matéria que gosta e que entusiasticamente ouve pela primeira vez :)

    Belissimo.

    beijinhos

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