quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Poema da Poetisa Galega Rosalia Castro










CANTIGA

Tradução de Henriqueta Lisboa



Eu cantar, cantar, cantei;

a graça não era muita,

pois nunca por meu pesar,

fui eu menina graciosa.

Cantei como foi possível,

dando voltas e mais voltas

assim como quem não sabe

perfeitamente uma cousa.

Porém depois de mansinho

e um pouco mais alto agora,

fui soltando essas cantigas

como quem não quer a cousa.

Eu bem quisera, é verdade,

que elas fossem mais bonitas;

eu bem quisera que nelas

bailasse o sol com as pombas,

as brancas águas com a luz,

e os ares mansos com as rosas.

Que nelas claras se vissem

a espuma das verdes ondas,

do céu as brancas estrelas

da terá as plantas formosas,

as névoas de cor sombria

que lá nas montanhas voam;

os pios do triste mocho,

as campainhas que dobram

a primavera que ri,

e os passarinhos que voam.



E canta que canta, enquanto

os corações tristes choram.

Isto e ainda mais quisera

dizer com língua graciosa;

mas onde a graça me falta,

o sentimento me sobra.

Entretanto isto não basta

par explicar certas cousas

que, às vezes, por fora um canta

enquanto por dentro chora.

Não me expliquei qual quisera:

sou de pouca explicação;

se graça em cantar não tenho,

o amor da terra me afoga.

Eu cantar, cantar, cantei,

a graça não era muita,

mas que fazer — desgraçada! —

se não nasci mais graciosa.

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