"As minhas palavras têm memórias ____________das palavras com que me penso, e é sempre tenso _________o momento do mistério inquietante de me escrever"
quarta-feira, 17 de junho de 2015
Da CIÊNCIA...
A Roseta, a File e os hieróglifos do sistema solar
TERESA FIRMINO
14/11/2014 - 21:18
Os nomes das duas sondas da Agência Espacial Europeia remetem para a história do Antigo Egipto.
A Pedra de Roseta, que está no Museu Britânico, tem inscrições em hieróglifos, demótico e grego
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File ou Philae, Roseta ou Rosetta? Na verdade, para onde remetem os nomes destas duas sondas da Agência Espacial Europeia (ESA)? Levam-nos até à história do Antigo Egipto e à decifração dos hieróglifos – ou mais exactamente, até à Pedra de Roseta e à ilha de File.
A Pedra de Roseta foi descoberta em 1799, por um militar francês durante a campanha napoleónica ao Egipto. Na versão considerada mais provável dos acontecimentos, a pedra estava embutida na muralha de um antigo forte na cidade de Roseta (ou Rechid, em árabe), no delta do rio Nilo. As tropas francesas iam demolir a muralha, mas o tenente-engenheiro Pierre-François Bouchard ter-se-á apercebido da importância da pedra. A sua particularidade é que tem o mesmo texto escrito em três sistemas de escrita diferentes – hieróglifos, demótico e grego. Como o grego podia ser traduzido, talvez a pedra, ainda que incompleta, pudesse ser a chave de leitura dos hieróglifos e assim desvendar todo um passado, até aí inacessível, de inscrições em monumentos e textos em papiros.
O historiador francês Jean-François Champollion era um dos estudiosos que se debatiam com a decifração dos hieróglifos. Até 1821, num artigo que publicou sobre os antigos egípcios, Champollion estava convencido de que nenhum hieróglifo tinha valor fonético, ou seja, nenhum correspondia a um som ou letra de um alfabeto. Mas meses depois desse artigo mudaria de ideias, ao receber a cópia de uma inscrição que tinha sido encontrada num obelisco na ilha de File, ilha no Nilo que depois foi inundada com a construção da barragem do Assuão.
Descobertas em 1815, as inscrições no obelisco – que pouco depois foi comprado pelo explorador e egiptólogo britânico William John Bankes – estavam em hieróglifos e grego. Ao comparar as duas inscrições, Bankes pensou ter identificado o nome de Cleópatra nos hieróglifos, e anotou esse facto na margem da cópia das inscrições que chegou mais tarde a Champollion.
Por sua vez, quando Champollion comparou a parte dos hieróglifos que teriam o nome de Cleópatra no obelisco com a parte dos hieróglifos que tinha o nome de Ptolomeu na Pedra de Roseta, o historiador francês verificou que havia sinais comuns e que apareciam nas posições esperadas se os nomes fossem escritos com caracteres alfabéticos. O historiador francês é hoje considerado o pai da decifração dos hieróglifos.
A Pedra de Roseta, que após a rendição das tropas francesas, em 1801, passou para mãos britânicas, encontra-se agora no Museu Britânico, em Londres. E o obelisco de File está em Kingston Lacy, uma mansão, na cidade britânica deWimborne Minster, que pertenceu à família Bankes.
Foi neste passado que se inspirou a equipa de cientistas e engenheiros que estava a planear, na década de 1980, uma visita ao núcleo de um cometa, quando decidiu chamar Roseta à sonda-mãe. Tal como a Pedra de Roseta, os cientistas esperavam que essa missão espacial ajudasse a decifrar os mistérios do início do sistema solar (formado numa nuvem de poeiras e gases), incluindo a origem da água e da vida na Terra. Os cometas são restos de poeiras e gelos desses tempos primordiais, que ficaram preservados até hoje, e que terão bombardeado violentamente a Terra no início da sua formação. Ao saber exactamente como os cometas são constituídos, eles podem ser uma chave para o passado do sistema solar.
Já o nome da sonda File resultou de um concurso lançado pela ESA pouco tempo antes de as duas sondas, uma agarrada à outra, partirem da Terra em 2004, para uma viagem de dez anos até ao cometa 67P/Churiumov–Gerasimenko. Na última quarta-feira (12 de Novembro), essa longa viagem atingiu o ponto alto, com a File a protagonizar uma proeza inédita: libertou-se da sonda Roseta e iniciou uma viagem de 20 quilómetros sozinha até aterrar no núcleo do cometa.
Voltando ao concurso da ESA, a vencedora, que ganhou uma viagem à Guiana Francesa para assistir à descolagem da missão, foi a italiana Serena Olga Vismara, então com 15 anos, que vivia em Arluno, perto de Milão. “Quando vi o concurso, procurei informações sobre a Pedra de Roseta na Internet e tive a ideia de lhe dar o nome” da ilha, contava na altura Serena Olga Vismara, que hoje estuda engenharia aeroespacial.
E como é que em português se chama essa ilha? Chama-se File, como refere oDicionário Lello. Tem uma grafia portuguesa, tal como o nome próprio da cidade onde foi encontrada a célebre pedra, que em inglês se escreve com dois “t” e em português Roseta.
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