sexta-feira, 3 de julho de 2015

Poema do nosso Mário Dionísio



Poema de Mário Dionísio (1916-1993), in Net

Para Ser Lido Mais Tarde

Um dia
quando já não vieres dizer-me Vem
jantar


quando já não tiveres dificuldade
em chegar ao puxador
da porta quando

já não vieres dizer-me Pai
vem ver os meus deveres

quando esta luz que trazes nos cabelos
já não escorrer nos papéis em que trabalho

para ti será o começo de tudo

Uma outra vida haverá talvez para os teus sonhos
um outro mundo acolherá talvez enfim a tua oferenda

Hás-de ter alguma impaciência enquanto falo
Ouvirás com encanto alguém que não conheço
nem talvez ainda exista neste instante

Mas para mim será já tão frio e já tão tarde

E nem mesmo uma lembrança amarga
ou doce ficará
desta hora redonda
em que ninguém repara

Mário Dionísio, in 'O Silêncio Voluntário'

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