domingo, 30 de novembro de 2014

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Projecto português para desenvolver terapia genética contra o VIH ganha 100 mil euros


NICOLAU FERREIRA

29/11/2014 - 10:27


Objectivo da investigação passa por travar a replicação do VIH e minar o reservatório viral que torna a infecção crónica. Financiamento europeu será para os próximos dois anos.Pedro Borrego lidera o projecto vencedor DR




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Saúde


Um projecto português para travar a infecção do vírus da sida foi um dos vencedores de um concurso europeu, e recebeu 100 mil euros para ser desenvolvido nos próximos dois anos. A investigação, que ainda está em fase laboratorial, aposta numa terapia genética pioneira.

Na próxima segunda-feira, 1 de Dezembro e dia mundial da sida, o investigador Pedro Borrego, responsável pelo projecto, irá receber o Prémio Partnering for Cure Research Funding 2014, financiado pela empresa farmacêutica Bristol-Myers Squibb com sede em Nova Iorque, no X Congresso Nacional VIH-SIDA da Associação Portuguesa para o Estudo Clínico da SIDA, em Lisboa. O concurso europeu tinha 300.000 euros para dar, que foram divididos por quatro projectos liderados por jovens investigadores no âmbito da investigação do vírus da sida e do vírus da hepatite B.

“Este tratamento permite que se controle a infecção do VIH na ausência de medicação anti-retroviral”, diz Pedro Borrego ao PÚBLICO sobre o projecto que quer desenvolver. O cientista de 34 anos, formado em ciências farmacêuticas, tirou o doutoramento na área do VIH e trabalha no Instituto Superior de Saúde Egas Moniz como pós-doutorado. Durante o doutoramento, o cientista desenvolveu parte do trabalho agora incluído no novo projecto, que tentará desmantelar o quebra-cabeças que torna, para já, a infecção do VIH invencível.

Desde os primeiros casos de sida observados no início da década de 1980, que o VIH já matou 39 milhões de pessoas. Até ao final do ano passado, 35 milhões de pessoas viviam com o vírus, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). Enquanto não foram descobertos os primeiros anti-retrovirais, a infecção do VIH era uma sentença de morte.

O vírus, que existe em fluidos humanos como o sangue, o esperma, o fluido pré-ejaculatório, o fluido vaginal, o fluido anal e o leite materno, pode ser transmitido a outra pessoa (independentemente de já se estar infectada ou não pelo VIH) de várias formas: quando um destes fluidos entra em contacto com as membranas mucosas, que existem na boca, na vagina, no pénis e no ânus; quando entra em contacto com uma ferida externa ou interna; ou no caso do uso de seringas ou de transfusões de sangue contaminados com o vírus. Só em 2013, houve mais 2,1 milhões de casos novos.

Dentro do corpo, o vírus entra em muitas células diferentes do sistema imunitário, onde fica pouco tempo e multiplica-se abundantemente. Sem tratamento, os linfócitos CD4 – a classe de células do sistema imunitário mais fustigada por este vírus – vão desaparecendo. Por isso, o corpo deixa de ser capaz de responder a infecções que normalmente são resolvidas facilmente. As pessoas desenvolvem doenças cada vez mais difíceis de debelar, é nesta fase que têm o síndrome de imunodeficiência adquirida (sida).

Os anti-retrovirais mudaram a face mais negra da sida, matam os vírus activos impedindo a morte das células do sistema imunitário. De acordo com a OMS, das 35 milhões de pessoas com o VIH no final do ano passado, 28 milhões estavam em condições de receber estes tratamentos, mas apenas 12,9 milhões de pessoas tinham acesso a estes medicamentos.

No entanto, se o vírus sofrer mutações e passar a ser resistente aos anti-retrovirais ou se uma pessoa deixar de ter condições para tomar os medicamentos, o fantasma da sida volta a surgir graças a uma estratégia de sobrevivência do VIH. Ao mesmo tempo que se vai multiplicando, o ADN do VIH é incorporado no genoma de muitas células de classes diferentes, dando ao vírus uma existência latente.

Por isso, mesmo que os anti-retrovirais tenham erradicado todos os vírus activos, de tempo em tempo, um destes genomas viral volta à vida, produz inúmeras cópias e o vírus espalha-se pelo corpo outra vez. Se uma pessoa infectada com o VIH não tomar continuadamente os medicamentos, a infecção recomeça. Assim, até ver, as pessoas têm que tomar estas fármacos para o resto da vida, sujeitando-se a sofrerem vários efeitos secundários e arriscando-se a que haja mutação e o vírus ganhe resistências.

Mas, com o novo projecto, Pedro Borrego quer atacar o vírus em duas frentes sem ajuda dos anti-retrovirais. Por um lado, o objectivo é evitar novas replicações, por outro, é inutilizar o ADN viral que está escondido no genoma de muitas células. Para isso, o projecto vai utilizar terapia genética. No trabalho também estão envolvidos Nuno Taveira, investigador principal da equipa de Pedro Borrego, e Helena Florindo, investigadora da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa.

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