quarta-feira, 23 de julho de 2014

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AFASTAR A POLÍTICA DAS PESSOAS


publicado na edição de hoje, 23 de julho, do Diário de Aveiro.

Debaixo dos Arcos

Afastar a política das pessoas

Há cada vez menos pessoas interessadas na política e nos partidos. Há cada vez menos gente nos partidos. As pessoas cada vez acreditam menos no sistema, nos partidos e nos políticos. A prová-lo estão os números de abstenções, votos nulos e brancos. A prová-lo está o crescente número de movimentos de independentes (reveja-se o que se passou nas últimas eleições autárquicas) de candidaturas e candidatos mediáticos (como aconteceu nas últimas eleições europeias).

As responsabilidades têm de ser repartidas já que o notório afastamento dos cidadãos para a participação cívica e para o exercício da cidadania é, também, responsabilidade dos mesmos. Não basta transferir as “culpas” para os outros e ficar sempre à espera que tudo aconteça por “obra e graça do Espírito Santo” (o divino, claro… não o banco).

No entanto, também não deixa de ser verdade que a descredibilização do sistema democrático, da política, da relevância da militância e dos partidos, tem a sua principal origem na fraca imagem que os políticos têm transmitido para a opinião pública. E apesar de ser um facto que esta realidade, infelizmente, não é nova os últimos tempos têm-na confirmado e reforçado.

A meio do mandato deste Governo, entre outras peripécias escusadas, tivemos uma demissão irrevogável que deu lugar à promoção ministerial de Paulo Portas, apesar de manter a coligação governamental presa por um fio. Para além dos conhecidos avanços e recuos das posições do CDS em matérias fiscais e sociais (IRS, outros impostos, benefícios sociais e cortes nas pensões).

Há ainda a questão da luta interna no Partido Socialista pela “cadeira do poder”. Embora o timing político, para António Costa, não pudesse ser outro, nada fazia prever este conflito interno, pelos resultados alcançados nas eleições autárquicas de setembro de 2013 e nas eleições europeias de maio passado (apesar da ausência da vitória esmagadora tão anunciada e desejada). O certo é que toda esta desventura socialista tem gerado uma imagem dos políticos e da política muito pouco desejável, tem descredibilizado o partido, o seu papel como maior partido da oposição, bem como torna improvável, ou, pelo menos, questionável, uma eventual vitória eleitoral em 2015. Além disso, tem criado um considerável número de clivagens internas, de roturas e posicionamentos contraditórios quanto ao futuro do partido e do país: opções políticas; presidenciais; eventuais coligações futuras; entre outros.

Mas há mais… a própria fracturação da esquerda, cada vez mais espartilhada entre projectos mais pessoais que ideológicos não tem contribuído em nada, antes pelo contrário, para a credibilização da política. A falta de convergência, o empurrar o PS cada vez mais para o centro (o que aliás ficou confirmado em 2011, no governo de José Sócrates), a rotura no Bloco de Esquerda, e o surgimento de novas plataformas como o Livre e, prevista para hoje, na Casa da Imprensa, a eventual plataforma de esquerda, promovida por Ana Drago e Daniel Oliveira, sustentada na corrente fundadora Política XXI do BE (agora dissidentes), no Congresso Democrático das Alternativas e no Manifesto 3D.

Por último, o Primeiro-ministro volta a dar o seu “contributo” para esta realidade. Já por diversas vezes a questão foi aqui abordada e volta a sê-lo porque, de uma vez por todas, é altura do Governo não tomar os portugueses por parvos. Na passada semana, ao apresentar relatório da OCDE sobre a consolidação da reforma estrutural em Portugal, solicitado pelo Governo, Passos Coelho elogiou a recuperação social e económica de Portugal. Só que faltou à verdade. Por inúmeros factores (desemprego, cortes salariais e nas reformas, carga fiscal, baixa economia, etc.) o país está mais pobre… o país e os portugueses. Os dados referidos por Passos Coelho diziam respeito ao intervalo entre 2007 e 2011, precisamente antes de tomar posse. Nesta data, os valores divulgados pelo INE indicam que a taxa de pobreza aumentou, em 2011, para os 18,7%, valor muito próximo do ano de 2005. Além disso, aumentou o fosso entre os mais ricos e os mais pobres e o número de portugueses e famílias muito perto do limiar da pobreza aumentou também de forma significativa para níveis mais elevados dos últimos 20 anos: 27,3% dos portugueses.

Isto não é credibilizar a política. Em política não pode valer tudo, muito menos faltar à verdade.
PUBLICADO POR MPARAUJO ÀS 09:27
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