quinta-feira, 24 de outubro de 2013

SOBRE O ESCRITOR ALVES REDOLe a obra "GAIBÉUS"








Opinião



(dos dicionários: gaibéu, s. m. jornaleiro da província portuguesa do Ribatejo ou da Beira Baixa que vai trabalhar nas lezírias durante as mondas.) -IN NET-O Citador

"É o primeiro romance de Alves Redol, publicado em 1939. Como viria a confirmar-se em obras posteriores, este primeiro trabalho do autor é uma das suas incursões ao país real, rural, de um povo trabalhador e explorado. Conta a vida desses jornaleiros que trabalhavam na monda do arroz numa das lezírias do Ribatejo. Homens e mulheres que vinham de outras terras, como alugados para um trabalho duro, de sol a sol, e de fraca paga. Alves Redol, com uma escrita nascida na oralidade do povo (e por isso o leitor tem de contar com algumas palavras e expressões menos comuns), retrata com um realismo cruel o modo de vida dos gaibéus, que ganhavam o seu sustento na época das mondas do arroz. Os maus-tratos, as más condições de trabalho, a exploração nua e crua, o abismo social entre o proprietário e o assalariado, a resignação e passividade de uns e a consciência e angústia de outros, são o tema deste grande livro desse grande escritor tão pouco lembrado.

As personagens são uma e todas ao mesmo tempo. Um povo resignado que luta afincadamente durante o tempo quente, antes da chegada do Inverno, em condições extremas para fazer render os poucos cobres que lhes pagam por tamanha dureza. Por um lado o trabalho árduo de sol a sol, as doenças (malária), a fadiga e a teimosia em cada vez se fazer o trabalho mais rápido para mais rendimento obter, a sede, a fome, a pobreza extrema. Por outro lado, o modo como preenchiam as escassas horas de lazer, os sonhos de uma vida melhor, os projectos sem logro, o vinho para alegrar os espíritos. As mulheres ainda sofrem de outro tipo de exploração, sendo sujeitas aos caprichos do senhor das terras que as escolhe para os seus prazeres carnais.

E o futuro espelhado numa velha que acaba por enlouquecer, fraca e doente, mas com o mesmo anseio de pegar na foice para acabar o trabalho, iludindo-se, febrilmente delirante, no gabar-se de ainda ser o exemplo para os outros de como é uma verdadeira mondadeira.

Há também a personagem que remói as palavras duras dos capatazes e cerra de raiva os dentes na presença do patrão. Uma consciência da exploração de que é vítima, mas de que não tem fuga possível, a não ser, talvez, tentar a sorte em terras distantes como Brasil e África de onde alguns retornavam abastados.

E quando enfim o Inverno chega e a monda se acaba, os jornaleiros regressam com esse sabor amargo às suas terras de origem, preparando-se, no ano seguinte, para procurar trabalho no mesmo rancho, em outras lezírias…

Narrativa muito bem construída que, exceptuando algumas palavras e expressões que requerem o uso do dicionário e um pouco de experiência junto das gentes rurais, se lê muito bem e com grande satisfação e curiosidade, uma vez que se trata do retrato fiel do homem português explorado até aos limites na década de trinta; portanto, que faz parte da nossa memória.

Um livro que se recomenda, num alerta a todas as consciências, pois que, ainda que vivamos no século XXI, a exploração do homem pelo homem está longe de acabar, embora as circunstâncias sejam diferentes…

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