quarta-feira, 24 de agosto de 2016

ANGOLA NAS MÃOS DE José Eduardo dos Santos e família! ----Artigo completo em www.publico.pt

ENTREVISTA

O modo como José Eduardo dos Santos promove família "é claro sinal de força"

Ricardo Soares de Oliveira, que há anos investiga Angola, analisa o último congresso do MPLA e recente nomeação de vice-presidente do partido.
O Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, nomeou dois filhos para o comité central do MPLA REUTERS/SIPHIWE SIBEKO/FILES
Autor de um livro fundamental sobre Angola, Magnífica e Miserável: Angola Desde a Guerra Civil (2015, Tinta-da-China) Ricardo Soares de Oliveira é um observador das dinâmicas de poder no país há anos. Respondeu ao PÚBLICO por email, no meio das suas férias de professor no Departamento de Política e Relações Internacionais da Universidade de Oxford, no dia em que foram anunciados o novo vice-presidente do MPLA, o ministro da Defesa João Lourenço, e o novo secretário-geral, Paulo Kassoma. Soares de Oliveira trabalhou para instituições como o Banco Mundial ou a Oxfam e escreveu também Oil and Politics in the Gulf of Guinea (2007), tendo co-editado ChinaReturns to Africa (2008, com Chris Alden e Daniel Large) e de The New Protectorates: International Tutelage and the Making of Liberal States(2012, com James Mayall). É ainda académico de Políticas Públicas no Woodrow Wilson Center e fellow convidado da Universidade de Yale, ambas instituições americanas.
Na polémica da ida de partidos políticos portugueses ao congresso do partido em Luanda, diz que o problema não é a sua presença mas “afirmações bajuladoras de afecto incondicional em relação ao MPLA”. Esta terça-feira foi noticiado que o PS, PSD, BE e CDS foram convidados para o II Congresso ordinário do partido da oposição Convergência Ampla de Salvação de Angola – Coligação Eleitoral (CASA-CE), que se realiza em Luanda a 6 e 7 de Setembro – só o PS não tinha confirmado a sua presença, segundo a Lusa.
O Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, no seu discurso de abertura do congresso, atacou os empresários corruptos e falou em apoiar os empresários patriotas. Como lê estas palavras?
Mais vale tarde do que nunca, é uma excelente ideia. O Presidente estaria, talvez, a referir-se às pessoas que beneficiaram de acesso político e que construíram grandes fortunas na base de rendas, sem nunca ter investido nos sectores produtivos do país ou exibido talento empreendedor. Há aqui dois problemas: o primeiro, é que essa situação foi um produto das políticas do próprio Presidente que, com o pretexto de construir a burguesia nacional, criou uma classe de rendeiros. O segundo problema é que, do ponto de vista factual, a descrição do Presidente assenta que nem uma luva a pessoas muito próximas dele. São afirmações correctas, mas muito sensíveis no contexto do tal empresariado angolano, onde o que não falta são telhados de vidro. Obviamente que há empresários a sério em Angola, agora importa apoiá-los, e deixar de apoiar os outros. Vamos ver.
Representantes de partidos políticos portugueses foram a Luanda ao Congresso, à excepção do Bloco de Esquerda. Estamos perante uma legitimação, da parte destes partidos portugueses, do regime angolano? Que protocolo se deveria seguir?
Tendo em vista o comportamento recente do Governo angolano no que diz respeito a questões de direitos humanos (Cabinda, Huambo, os 15+2), seria sempre um ano estranho para gestos extremosos de amizade interpartidária. Mas a presença de representantes dos partidos portugueses no Congresso do MPLA é legítima, desde que faça parte de uma postura equidistante que, por exemplo, inclua presença nos congressos da UNITA, CASA, etc., e que se limite a observação discreta. O verdadeiro problema são as afirmações bajuladoras de afecto incondicional em relação ao MPLA, que demonstram uma proximidade facciosa no quadro angolano. Mas nada disso surpreende; tudo se enquadra num contexto mais lato de intimidade entre segmentos da elite portuguesa e a cúpula do partido dirigente.

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