segunda-feira, 21 de abril de 2014

Sobre Flannery O'Connor (1925-1964)-in www.spncultura.org/














Literatura

Descobrir Flannery O’Connor

1.
Há quem, do labor de Mary Flannery O’Connor (dois romances e o fragmento de um terceiro; uma trintena de contos; ensaios e cartas), retenha apenas o olho agudo, o formidável ouvido minucioso, o dente duro. E compreende-se: o seu virtuosismo dá vertigens. Ela persegue a gesticulação, as injunções, as manias; ela apanha o timbre e os clichés de todo o género para, irremediavelmente, soterrar o leitor debaixo do riso e do terror. Sim, há até uma ascendência: o grotesco como tradição literária, naquele Sul infestado de contadores populares e de profetas, o Sul de Poe e Faulkner. Mas «não se pode dizer que Cézanne pintava maçãs sobre uma tolha e pretender ter dito aquilo que Cézanne pintava». Vejamos como Flannery se explica: «Quando uma criança se põe a desenhar, não tem a intenção do grotesco, mas procura simplesmente transcrever aquilo que vê. E como o seu olhar é directo, vê linhas que criam movimento... A mim interessam-me as linhas que criam movimento espiritual». Podem, de facto, coexistir modos diferentes de ler as suas narrativas originalíssimas, ocres, desdenhosamente esplêndidas. O tempo tem tornado evidente que elas pertencem à antologia das grandes narrativas do Ocidente. Contudo ela as escreveu de um modo apenas, e de nenhum outro: tudo o que escreveu foi por ser católica; o motor da sua percepção foi a Fé somente; e todos os seus motivos remetem para o núcleo vital dos mistérios cristãos.

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