quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Através da wikipédia-Excertos sobre a Implantação da República portuguesa












O regicídio de 1908[editar | editar código-fonte]
Ver artigo principal: Regicídio de 1908

Reconstituição anónima do Regicídiopublicada no jornal "Folha Volante".

A 1 de fevereiro de 1908, quando regressavam a Lisboa vindos de Vila Viçosa, no Alentejo, onde haviam passado a temporada de caça, o rei D. Carlos e o príncipe herdeiro Luís Filipe foram assassinados em plena Praça do Comércio40 .

O atentado ficou a dever-se ao progressivo desgaste do sistema político português, vigente desde a Regeneração41 , em grande parte devido à erosão política originada pela alternância de dois partidos no poder: o Progressista e o Regenerador. O rei, como árbitro do sistema político, papel que lhe era atribuído pelaConstituição, havia designado João Franco para o lugar de presidente do Conselho de Ministros (chefe do governo)42 . Este, dissidente do Partido Regenerador, conseguiu convencer o rei a encerrar o parlamento para poder implementar uma série de medidas com vista à moralização da vida política43 41 . Com esta decisão acirrou-se toda a oposição, não só apenas a republicana, mas também a monárquica, liderada pelos políticos rivais de Franco que o acusavam de governar em ditadura43 . Os acontecimentos acabaram por se precipitar na sequência da questão dos adiantamentos à Casa Real (regularização das dívidas régias ao Estado) e da assinatura do decreto de 30 de janeiro de 1908 que previa o degredo nas colónias, sem julgamento, aos envolvidos numa intentona republicana fracassada ocorrida dois dias antes, o Golpe do Elevador da Biblioteca44 .
Vi um homem de barba preta [...] abrir a capa e tirar uma carabina [...]. Quando [o] vi [...] apontar sobre a carruagem percebi bem, infelizmente, o que era. Meu Deus, que horror o que então se passou! Logo depois do Buíça ter feito fogo [...] começou uma perfeita fuzilada, como numa batida às feras! Aquele Terreiro do Paço estava deserto, nenhuma providência! Isso é que me custa mais a perdoar ao João Franco...


— D. Manuel II45


A família real encontrava-se então no Paço Ducal de Vila Viçosa44 , mas os acontecimentos levaram o rei D. Carlos a antecipar o regresso a Lisboa, tomando o comboio na estação de Vila Viçosa na manhã do dia 1 de fevereiro. A comitiva régia chegou ao Barreiro ao final da tarde, onde, para atravessar o Tejo, tomou o vapor D. Luís, desembarcando no Terreiro do Paço, em Lisboa, por volta das 17 horas46 . Apesar do clima de grande tensão, o rei optou por seguir em carruagem aberta, com uma reduzida escolta, para demonstrar normalidade44. Enquanto saudavam a multidão presente na praça, a carruagem foi atingida por vários disparos. Um tiro de carabina atravessou o pescoço do rei46 , matando-o imediatamente44 . Seguiram-se vários disparos, sendo que o príncipe real conseguiu ainda alvejar um dos atacantes, sendo em seguida atingido na face por um outro disparo44 . A rainha, de pé, defendia-se com o ramo de flores que lhe fora oferecido, fustigando um dos atacantes, que subira o estribo da carruagem, gritando "Infames! Infames!".14 O infante D. Manuel foi também atingido num braço.14 Dois dos regicidas, Manuel Buíça, professor primário, e Alfredo Costa, empregado do comércio e editor, foram mortos no local. Outros fugiram. A carruagem entrou no Arsenal da Marinha, onde se verificou o óbito do rei e do herdeiro ao trono.14

Após o atentado, o governo de João Franco foi demitido e foi lançado um rigoroso inquérito que, ao longo dos dois anos seguintes, veio a apurar que o atentado fora cometido por membros da Carbonária47 . O processo de investigação estava já concluído nas vésperas do 5 de outubro de 1910. Entretanto, tinham sido descobertos mais suspeitos de envolvimento direto, sendo que alguns estavam refugiados noBrasil e em França e dois, pelo menos, tinham sido mortos pela própria Carbonária48 .

A Europa ficou chocada com este atentado, uma vez que D. Carlos era muito estimado pelos restantes chefes de estado europeus49 . O regicídio de 1908 acabou por abreviar o fim da monarquia ao colocar no trono o jovem D. Manuel II e lançando os partidos monárquicos uns contra os outros40 .
A agonia da monarquia[editar | editar código-fonte]
As suas demonstrações de força [dos republicanos] nas ruas de Lisboa — por exemplo, a de 2 de Agosto de 1909, que reuniu cinquenta mil pessoas, numa disciplina impressionante — fazem eco aos tumultos organizados na Assembleia por alguns deputados republicanos. Foi na noite desse dia 2 de Agosto que compreendi que a coroa estava em jogo: quando o rei, com razão ou sem ela, é contestado ou rejeitado por uma parte da opinião, deixa de conseguir cumprir o seu papel unificador.


Amélia de Orleães50


Devido à sua tenra idade (18 anos) e à forma trágica e sangrenta como alcançou o trono, D. Manuel II auferiu inicialmente de uma simpatia generalizada51 . O jovem rei começou por nomear um governo de consenso, presidido pelo almirante Francisco Joaquim Ferreira do Amaral. Este governo de acalmação, como ficou conhecido, apesar de lograr acalmar momentaneamente os ânimos, teve duração breve.52 A situação política rapidamente voltou a degradar-se, tendo-se sucedido sete governos em dois anos. Os partidos monárquicos voltaram às costumeiras questiúnculas e divisões, fragmentando-se, enquanto o Partido Republicano continuava a ganhar terreno. Nas eleições de 5 de abril de 1908, a última legislativa na vigência da monarquia, foram eleitos sete deputados, entre os quaisEstêvão de Vasconcelos, Feio Terenas e Manuel de Brito Camacho. Nas eleições de 28 de agosto de 1910 o partido teve um resultado arrasador, elegendo 14 deputados, dez deles por Lisboa53 .

No entanto, apesar dos evidentes êxitos eleitorais alcançados pelo movimento republicano, o setor mais revolucionário do partido advogava a luta armada como melhor meio de tomar o poder a curto prazo. Foi esta fação que saiu vitoriosa do congresso do partido realizado em Setúbal entre 23 e 25 de abril de 190954 . O diretório, composto pelos moderados Teófilo Braga, Basílio Teles, Eusébio Leão, José Cupertino Ribeiro e José Relvas, recebeu do congresso o mandato imperativo de fazer a revolução. As funções logísticas de preparação da intentona foram confiadas a elementos mais radicais. O comité civil era formado por Afonso Costa, João Chagas e António José de Almeida, enquanto que o almirante Cândido dos Reis liderava o comité militar55 . António José de Almeida ficou encarregue da organização das sociedades secretas, como a Carbonária — em cuja chefia se integrava o comissário naval António Machado Santos56 —, a Maçonaria57 e a "Junta Liberal", dirigida por Miguel Bombarda. A este eminente médico ficou a dever-se uma importante ação de propaganda republicana junto do meio burguês e que trouxe muitos simpatizantes à causa republicana58 .

O período entre o congresso de 1909 e a eclosão da revolução foi marcado por uma grande instabilidade e agitação política e social59 , com várias ameaças de sublevação pondo a revolução em risco devido à impaciência do pessoal da marinha, chefiado por Machado Santos, que estava disposto a todos os riscos.60
A revolta[editar | editar código-fonte]

A 3 de outubro de 1910 estalou a revolta republicana que já se avizinhava no contexto da instabilidade política61 . Embora muitos envolvidos se tenham esquivado à participação — chegando mesmo a parecer que a revolta tinha falhado — esta acabou por suceder graças à incapacidade de resposta do governo, que não conseguiu reunir tropas que dominassem os cerca de duzentos revolucionários que na Rotundaresistiam de armas na mão62 .
Os primeiros movimentos dos revolucionários[editar | editar código-fonte]

O primeiro-ministro Teixeira de Sousa

No verão de 1910 Lisboa fervilhava de boatos e várias vezes foi o presidente do Conselho de Ministros (primeiro-ministro) Teixeira de Sousa, avisado de golpes iminentes63 . A revolução não foi exceção: o golpe era esperado pelo governo64 , que a 3 de outubro deu ordem para que todas as tropas da guarnição da cidade ficassem de prevenção. Após o jantar oferecido em honra de D. Manuel II pelo presidente brasileiro Hermes da Fonseca, então em visita de Estado a Portugal65 , o monarca recolheu-se ao Paço das Necessidades, enquanto seu tio e herdeiro jurado da coroa, o infante D. Afonso, seguia para a Cidadela de Cascais66 .

Após o assassinato de Miguel Bombarda, baleado por um dos seus pacientes64 67 , os chefes republicanos reuniram-se de urgência na noite de dia 368 . Alguns oficiais foram contra, dada a prevenção das forças militares, mas o almirante Cândido dos Reis insistiu para que se continuasse, sendo-lhe atribuída a frase: "A Revolução não será adiada: sigam-me, se quiserem. Havendo um só que cumpra o seu dever, esse único serei eu."69 70

Revoltosos concentram-se na Rotunda.

Machado Santos já havia passado à ação e nem esteve na reunião. Este dirigiu-se ao aquartelamento do Regimento de Infantaria 1671 , onde um cabo revolucionário provocara o levantamento da maior parte da guarnição: um comandante e um capitão que se tentaram opor foram mortos a tiro. Entrando no quartel com umas dezenas de carbonários, o comissário naval seguiu depois com cerca de 100 praças para o Regimento de Artilharia 172 , onde o capitão Afonso Palla e alguns sargentos, introduzindo alguns civis no quartel, já haviam tomado a secretaria, prendendo os oficiais que se recusaram a aderir73 . Com a chegada de Machado Santos formaram-se duas colunas, que ficaram sob o comando dos capitães Sá Cardoso e Palla. A primeira marchou ao encontro aos regimentos Infantaria 2 e Caçadores 2, que deviam também estar sublevados, para seguir para Alcântara onde deveriam apoiar o quartel de marinheiros. No percurso, cruzou-se com um destacamento da Guarda Municipal, pelo que procurou outro caminho. Depois de alguns confrontos com a polícia e civis, encontrou a coluna comandada por Palla e avançaram para a Rotunda, onde se entrincheiraram cerca das 5 horas da manhã. Compunha-se a força aí estacionada de 200 a 300 praças do Regimento de Artilharia 1, 50 a 60 praças de Infantaria 16 e cerca de 200 populares. Os capitães Sá Cardoso e Palla e o comissário naval Machado Santos, estavam entre os 9 oficiais no comando74 .

Entretanto, o tenente Ladislau Parreira e alguns oficias e civis introduziram-se no Quartel do Corpo de Marinheiros de Alcântara à uma hora da madrugada e conseguiram armar-se, sublevar a guarnição e aprisionar os comandantes, tendo um destes ficado ferido75 . Pretendia-se com esta ação impedir a saída do esquadrão de cavalaria da Guarda Municipal, o que foi conseguido76 . Para isto era necessário no entanto o apoio, em armas e homens, dos 3 navios de guerra ancorados no Tejo. Nestes o tenente Mendes Cabeçadas havia tomado o comando da tripulação sublevada do "Adamastor",77 enquanto a tripulação revoltada do "São Rafael" esperava um oficial para a comandar.

Pelas 7 da manhã Ladislau Parreira, sendo informado por populares da situação, despachou o segundo-tenente Tito de Morais para tomar o comando do "São Rafael", com ordens para que ambos os navios reforçassem a guarnição do quartel. Quando se soube que no "D. Carlos I" a tripulação se encontrava sublevada mas os oficiais se haviam entrincheirado, saíram do "São Rafael" o tenente Carlos da Maia com alguns marinheiros e civis. Após algum tiroteio, de que resultaram feridos o comandante do navio e um tenente, os oficiais renderam-se ficando o "D. Carlos I" também na mão dos republicanos75 .

O Cruzador português Dom Carlos I pintado por Giovanni Battista Castagneto

Foi a última unidade a juntar-se aos revoltosos que contava assim com parte do regimento de Artilharia 16 e de Artilharia 1, o corpo de marinheiros e os três navios citados. A marinha aderira em massa como esperado, mas muitos dos quartéis considerados simpatizantes não. Assim, os republicanos, somavam cerca de 400 homens na Rotunda, mas cerca de 1000 a 1500 em Alcântara, contando com as tripulações dos navios, além de se terem conseguido apoderar da artilharia da cidade, com a maioria das munições, ao que juntava a artilharia dos navios. Estavam ocupadas a Rotunda e Alcântara, mas a revolução ainda não estava decidida e os principais dirigentes ainda não haviam aparecido74 .

Mesmo assim, a princípio os acontecimentos não decorreram a favor dos revoltosos. O sinal de três tiros de canhão — que deveria ser o aviso para civis e militares avançarem — não resultou. Apenas um tiro foi ouvido e o almirante Cândido dos Reis, que esperava o sinal para tomar o comando dos navios, foi informado por oficiais que tudo falhara e retirou-se para casa da irmã. Ao amanhecer seria encontrado morto numa azinhaga em Arroios. Desesperado, suicidara-se com um tiro na cabeça75 .

Entretanto, na Rotunda, o aparente sossego da cidade desalentava de tal maneira os revoltosos que os oficiais acharam melhor desistir. Sá Cardoso, Palla e os outros oficiais retiraram-se para suas casas, mas Machado Santos ficou e assumiu o comando75 . Esta decisão seria fundamental para o sucesso da revolução.

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