quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

AVANÇOS DA CIÊNCIA...


Novo microscópio permite ver células cancerosas a três dimensões


NICOLAU FERREIRA

24/02/2016 - 12:06


Técnica que usa laser para iluminar amostras biológicas permite observação em tempo real de células num ambiente mais próximo do dos tecidos humanos vivos.





Duas células cancerosas observadas com o novo microscópio
WELF E DRISCOLL EL AL.





1 / 2



Showing image 1 of 2




0







TÓPICOS

Biologia
Saúde


A microscopia continua a actualizar-se, permitindo aos cientistas observar cada vez mais pormenores das células, num ambiente cada vez mais próximo do dos tecidos vivos. Agora, uma equipa de investigadores norte-americanos aprimorou uma técnica de microscopia com laser, produzindo imagens tridimensionais de células cancerosas humanas vivas com uma minúcia inédita.

As células foram colocadas no aparelho sem as dificuldades físicas que muitas vezes existem em microscopia, permitindo uma observação mais próxima do ambiente natural, no corpo humano, segundo o estudo publicado esta semana na revista Developmental Cell. Este pormenor é importante. A observação do comportamento das células mais próximo do natural poderá ajudar a descobrir como é que as células cancerosas resistem aos tratamentos contra o cancro e se espalham pelo corpo, produzindo as metástases.

A lâmina e a lamela são das primeiras palavras a entrar no vocabulário de quem frequenta as aulas iniciais de microscopia. A lâmina é um rectângulo de vidro grosso onde se coloca no centro o material biológico, que leva por cima algumas gotas de água ou de um líquido corante, quando se quer tingir uma estrutura celular para se ver melhor.

Depois, coloca-se a lamela – um quadrado finíssimo de vidro – por cima do material com o líquido, procurando evitar-se as bolhas de ar. A preparação fica pronta para se pôr na placa do microscópio. A lamela evita um contacto directo entre a lente do microscópio e o material, além de evitar o movimento do material.

No caso da película da epiderme de cebola – um material biológico clássico nas aulas de microscopia por permitir observar facilmente as células vegetais –, ela fica “esborrachada” entre a lâmina e a lamela. Se imaginarmos células animais, que, ao contrário das células vegetais, se movimentam, esta dificuldade física ainda tem mais repercussões. E não é só nas observações ao microscópio que este problema pode surgir. As culturas de células nos laboratórios crescem em caixas de vidro e estão assentes nesta superfície rígida, que é muito diferente do contexto dos tecidos animais.

Na investigação liderada por Reto Fiolka, especialista em microscopia da Universidade do Sudoeste do Texas, a equipa tentou comparar as diferentes morfologias observadas pelo novo microscópio em diferentes contextos. “As células de melanoma junto ao vidro exibem morfologias esticadas e com ramificações”, lê-se no artigo, explicando de seguida as diferenças observadas com a nova técnica de microscopia, onde as células não estão em contacto com nenhuma superfície rígida. “As células de melanoma que estão longe de qualquer superfície rija exibem morfologias arredondadas dominadas por pequenas bolhas. Estas observações sugerem que as limitações técnicas da microscopia [no passado] podem ter distorcido muito do nosso conhecimento actual sobre a organização espacial [da célula].”

Em busca do movimento
“O paper [artigo científico] é muito giro”, diz ao PÚBLICO Gabriel Martins, especialista em microscopia do Instituto Gulbenkian de Ciência, em Oeiras, que não esteve envolvido neste trabalho. O novo microscópio é um passo em frente em relação a uma técnica que se usa há cerca de uma década, explica o investigador português. A técnica funciona com um laser. “Mas em vez de se iluminar ponto por ponto, varrendo toda a amostra, o laser é transformado numa ‘folha’ e ilumina um plano inteiro de uma só vez”, diz o especialista. “Um plano permite ver o interior da massa de células e até ver o interior das próprias células com grande detalhe.”

A grande diferença do novo modo de estudo é a resolução desta técnica. Antes, as tais “folhas” de laser tinham entre um e dois micrómetros de grossura (um micrómetro é um milésimo de um milímetro). Agora, esta equipa conseguiu observar células com “folhas” de laser com 300 nanómetros de grossura (por isso, a resolução tem aumentado, passando-se de um a dois milésimos de milímetro para 0,3 milésimos de milímetro). Além disso, a equipa conseguiu manter uma massa de células cancerosas vivas no meio de uma matriz de colagénio, para as ver no microscópio.

Sem comentários:

Enviar um comentário