Literatura Eterna ou TemporalPenso eu que a literatura pode responder a interrogações, pode tentar responder-lhes, pode simplesmente pô-las e pode nem sequer pô-las. Há a contar com a variedade dos temperamentos literários. Coisa difícil, sei-o por experiência própria, embora deva estar na base de qualquer atitude crítica. Aceitemos, porém, que toda a grande literatura põe interrogações, e lhes procura resposta. Pergunto: Não poderá admitir-se que seja antes às interrogações eternas do homem eterno que a literatura procura responder? Não envelhecerá uma obra de arte precisamente na medida em que só responde às inquietações de uma época? E não perdurará na medida em que, através, ou não, de respostas provisórias a interrogações provisórias, sugere uma resposta eterna a interrogações eternas, exprime inquietações eternas embora de forma pessoal?
Diz Rodrigues Miguéis: «Uma literatura que não responde às interrogações da sua época - pelo menos - está condenada ao esquecimento.» Ora aquele importante pelo menos ao mesmo tempo salva e embrulha tudo nesta frase dúbia. Tal como está expresso, o pensamento de Rodrigues Miguéis é o seguinte: uma literatura, para viver, deve responder às interrogações que o homem se põe. Em primeiro lugar (parece) às eternas interrogações do homem de sempre; pois em não respondendo a estas, deverá responder, pelo menos, às da sua época.
José Régio, in 'Presença, Folha de Arte e Crítica, 1927-1940'
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