sábado, 24 de setembro de 2016

BARROSO já traía, antes de sair...


Arquivos da Comissão Europeia revelam que havia proximidade entre Barroso e Goldman Sachs


PAULO PENA

24/09/2016 - 07:00


Os banqueiros faziam chegar “confidencialmente” ao gabinete de Barroso sugestões de alteração às políticas da UE, que os seus conselheiros liam “com grande interesse”. São emails e cartas que mostram como o Goldman se dizia “encantado” com algumas posições de Barroso.
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No dia 30 de Setembro de 2013, Durão Barroso recebeu uma carta de Lloyd Blankfein. “Caro Presidente Barroso”, escreveu o polémico CEO do Goldman Sachs – o homem que numa entrevista comparou o seu trabalho de banqueiro ao “de Deus”. “Muito obrigado por ter conseguido roubar tempo à sua agenda para vir ao Goldman Sachs. Gostei muito da nossa discussão produtiva sobre as perspectivas económicas mundiais.”

Nessa mesma carta, Blankfein agradece ainda a Barroso por ter participado numa reunião com os “senior partners” do banco. “Sei que eles consideraram a sessão extremamente enriquecedora.” Estes encontros, que não foram tornados públicos na altura, estão descritos num dos 11 documentos (emails, cartas e mensagens) relativos à relação do gabinete do ex-presidente da Comissão Europeia com o banco de investimentos norte-americano entregues ao PÚBLICO depois de um pedido formal ao secretariado-geral da Comissão, em Julho.
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Nesse mês foi revelado que Durão Barroso passaria a desempenhar as funções de presidente não-executivo do Goldman Sachs International, com funções de aconselhamento sobre a estratégia para enfrentar a saída do Reino Unido da União Europeia, o que gerou uma polémica internacional e acusações, ao mais alto nível, na Comissão Europeia. O seu sucessor, Jean-Claude Juncker, anunciou recentemente que Barroso deixaria de ser recebido como ex-presidente da Comissão. Passará a ser um “representante de interesses”, ou seja, um lobbyista. Ainda esta sexta-feira, Durão Barroso disse estar ser alvo de "discriminação".

Nos documentos do mandato de Durão Barroso arquivados na Comissão Europeia não existe qualquer acta deste encontro na sede do banco norte-americano. Não há, sequer, registos de uma visita ao imponente edifício do n.º 200 da West Street, em Manhattan, nas agendas públicas do presidente da Comissão, esclarece a responsável pelo departamento europeu de acesso a documentos. Não se conhece outra deslocação do presidente da Comissão à sede de um banco de investimentos, para uma reunião discreta e fora da agenda pública.

Durão Barroso, numa resposta por escrito às perguntas do PÚBLICO, contextualiza: “Fui presidente da Comissão Europeia durante os anos em que a Europa e o mundo viveram uma das maiores crises financeiras da sua história. Naturalmente, mantive contactos institucionais – transparentes e convenientemente registados nos arquivos da Comissão – com as mais variadas entidades políticas, empresariais, sindicais e financeiras. Entre estas encontrei-me, como seria de esperar, com muitos dos principais bancos que operavam no mercado europeu. Tratava-se não só de conhecer o sentimento dos mercados, mas também de passarmos mensagens claras com a posição da Comissão e da União Europeia.”

Durão Barroso não quis, no entanto, especificar se visitou outros bancos, nem se se reuniu com outros conselhos de administração.

Os documentos do arquivo da Comissão dão conta de vários encontros de Durão Barroso com representantes do Goldman Sachs (Lloyd Blankfein, Peter Sutherland e Richard Gnodde) nos seus dez anos na presidência, e de alguns outros encontros entre membros do seu staff e dirigentes daquele banco. Porém, este arquivo não é exaustivo. Só a partir do final de 2014 passou a ser regra, na Comissão, a publicidade de todos os encontros de comissários com representantes de instituições ou interesses privados. Logo no primeiro emaildeste conjunto que o PÚBLICO revela, uma funcionária pergunta se oemail com um pedido de reunião de Hank Paulson, então CEO do Goldman, deve ser registado, para constar do arquivo. Uma outra funcionária (não identificada, uma vez que os serviços da Comissão rasuraram os nomes de todos os participantes nesta troca de correspondência que não fossem altos dirigentes ou titulares de cargos políticos) remete a pergunta para um superior hierárquico, com a indicação de que o conselheiro principal de Barroso “é desfavorável” ao arquivamento.

Ao contrário de Paulson, que saiu do Goldman para secretário do Tesouro de George W. Bush, nos EUA, os responsáveis europeus não doaram o seu telemóvel a nenhum museu, nem tornaram público o registo de chamadas ou as agendas de reuniões. A Europa divulga as reuniões “formais” e “informais” em que participam os seus dirigentes, mas não existe nenhum registo para encontros como o que juntou, lado a lado, Barroso e Peter Sutherland num jogo de futebol, no estádio do Manchester United, a 13 de Março de 2007. O que torna impossível detalhar a frequência dos contactos. Embora não a proximidade.

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