terça-feira, 29 de setembro de 2015

DE PORTUGAL...


Campanha. Que é feito dos empresários faladores e interventivos de outrora?


por Fernanda CâncioHoje11 comentários


Banqueiro Fernando Ulrich acha que empresários estão calados porque “estão tranquilos”. E explica: “O PS terá outro tipo de preocupações que o atual governo não teve, para as pessoas [em geral] será diferente. Mas para quem tem determinado tipo de responsabilidades e preocupações não fará diferença”


Noutras campanhas criaram movimentos, apelaram ao voto neste ou naquele, fizeram propostas e dinamizaram colóquios. Agora, nada. O DN tentou perceber porquê.


"Há silêncios muito ensurdecedores, muito ensurdecedores." A expressão é de Passos Coelho, dita na sequência de referências ao caso BES e logo após mencionar a necessidade de "ter à frente do Estado e do governo quem possa realmente lutar contra os privilégios." A quem se referiria Passos, que no dia seguinte (na passada segunda-feira) tentou esvaziar o enigma, dizendo que aludia às propostas do seu opositor sobre a Segurança Social? Quem é que costuma falar e está calado, e é geralmente associado à noção de privilégio por parte do Estado? E queria Passos que os calados falassem ou mudos permanecessem?

O banqueiro Fernando Ulrich, administrador do BPI, que entrou para o folclore nacional com o célebre "ai aguenta, aguenta", dito em outubro de 2012, a propósito de quanta mais austeridade poderia a sociedade portuguesa suportar e que foi entendido como um apoio ao governo e à respetiva retórica sobre a pieguice dos portugueses - a citação completa inclui uma comparação com os sem-abrigo: "Se aquelas pessoas que nós vemos ali na rua, naquela situação e a sofrer tanto, aguentam, porque é que nós não aguentamos?"-, ri. "Ouvi Passos dizer aquilo e fiquei surpreso. Não percebi o que o primeiro-ministro quis dizer ou de quem estaria a falar."

Falaria Passos dos empresários e banqueiros que noutras campanhas ou fases políticas andaram bastante ativos - houve, por exemplo, o Compromisso Portugal, lançado em 2004 (no qual Ulrich participou), e em 2011 o Movimento Mais Sociedade, ligado ao PSD, houve o apelo de Belmiro de Azevedo ao voto em Passos, as pegas de Alexandre Soares dos Santos com o anterior primeiro-ministro -, e nesta nem um ai? O homem forte do BPI reflete: "Porque é que penso que as pessoas estão caladas? Quando fui à Quadratura do Círculo [programa de debate político da Sic Notícias] substituir o Lobo Xavier, a determinada altura perguntaram-me sobre as escolhas e alternativas. E, à frente do António Costa - foi das últimas emissões em que ele ainda esteve - o que disse foi que a margem de manobra para fazer coisas diferentes é muito pequena porque o país vai continuar condicionado pela UE, pelo euro, pelos mercados. Pode haver ênfases diferentes, e o caminho não é o mesmo - com certeza que o PS terá outro tipo de preocupações que o atual governo não teve, para as pessoas será diferente. Mas para quem tem determinado tipo de responsabilidades e preocupações não fará diferença. Não me parece que haja razões para pôr em causa a estabilidade." Ou seja, para os empresários e banqueiros tanto faz, PAF ou PS? "Acho que as pessoas não ficam assustadas se o resultado das eleições for diferente daquele que querem. Estão tranquilas. E foi muito importante o António Costa ter feito o programa económico. Foi um bom contributo para a campanha e isso, mais o track record dele -as pessoas conhecem-no da Câmara de Lisboa - reforça-lhe a credibilidade."

Gatos escaldados?

António Saraiva, o diplomático presidente da Confederação da Indústria Portuguesa, ou, como costuma ser denominado, "representante dos patrões", tem outra explicação para o aparente alheamento dos empresários nestas eleições. "Não sei porque é que noutras alturas terão participado mais. Talvez porque foram mais solicitados pelos media ou pelos partidos e desta vez isso não ocorreu. Ou então os empresários resolveram manter-se calados porque gato escaldado de água fria tem medo." Há um sorriso na conversa telefónica, antes de Saraiva entrar no seu habitual registo de subtil ironia. "Se calhar andamos tão preocupados com a sobrevivência das nossas empresas que não temos tempo. Se calhar tem que ver com alguma equidistância natural. Uns são do Benfica, outros do Sporting, outros da Académica mas apresentámos um documento sobre o que esperamos do novo governo. "Não haverá também um efeito de todos os casos recentes que atingiram o mundo empresarial português, do BE à PT, e que transformaram os empresários e banqueiros em apoios pouco gratos? "Inevitavelmente o caso BES a somar aos anteriores não deixou de inquinar a imagem da banca. Mas não são todos iguais, naturalmente. Felizmente mais discretos temos outros empresários que vão fazendo o seu trabalho."

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