sexta-feira, 4 de maio de 2012


LITERATURA PORTUGUESA

CAMILO PESSANHA (1867/1926)

“CAMILO PESSANHA ensinou a sentir veladamente; descobriu-nos a verdade de que, para ser poeta, não é mister trazer o coração nas mãos, senão que basta trazer nelas a sombra dele”
FERNANDO PESSOA, in “DIMENSÂO LITERÁRIA”- ISBN972-0-40055-2


Nasceu CAMILO PESSANHA (C.P) em Coimbra, onde se formou em Direito.
Poeta do período conhecido como o da POESIA FINISSECULAR (fins do século XIX, princípios do séc. XX), autor de vasta obra da qual destacamos a colectânea de poemas, intitulada “CLEPSIDRA”, foi C.P. um verdadeiro cultor do SIMBOLISMO, um “homem poeta” que nos forçou a visualizar imagens da vida, com SINESTESIAS de uma beleza rara. O SIMBOLISMO preconizava, precisamente, que a cada Imagem correspondesse um som. Assim, a sua poesia é rica de imagens que, aliadas ao som que recordam, convertem a mesma em sensações maravilhosas, de um encanto inegável.
Ao descrever o som do violoncelo que toca ou das águas que passam sob a ponte, o leitor é, como que levado, a ouvi-los e a vê-las como se lá estivesse a “viver” o fluir das águas e dos sons musicais, que as mesmas sugerem.
DE notar que este violoncelo que toca, pode significar a própria VIDA! Quando jovens e saudáveis, no tempo em que “os Outonos”ainda não pesam, somos como instrumentos musicais, que tocam as mais belas melodias…
Seguidor do poeta simbolista EUGÉNIO de CASTRO, podemos afirmar, do que já ficou dito, que a sua poesia de angústia, pessimismo, desalento e solidão, transborda de impressionismo ao deixar-nos “ver” símbolos nas palavras.
Cada seu poema é, por conseguinte, rico de imagética (deixa ver imagens), que provoca sensações nos leitores, de modo a permitir uma ajuda preciosa na interpretação das mensagens.
Vejamos extractos do poema “VIOLONCELO /”: “Chorai arcadas/ Do violoncelo! / (…) Por baixo passam/Se despedaçam, /No rio, os barcos, / (…) Águas…Fundas, soluçam Caudais de choro…/”. É impossível não “ouvir” o violoncelo a “chorar”… e não ver as arcadas da ponte por onde passam os barcos… e não ouvir as águas do rio a correrem…
Num seu soneto, bem conhecido dos leitores da sua obra, diz o poeta: “Quem poluiu, quem rasgou os meus lençóis de linho (…)/ Quem quebrou(…) a mesa de eu cear, - tábua tosca de pinho?/ E me espalhou a lenha?E me entornou o vinho?/ (…) Ó minha pobre mãe!...Não te ergas mais da cova./Olha a noite, olha o vento. Em ruína, a casa nova…/ “.
Lindíssimo poema, de carácter rememorativo, onde”sentimos “ a infância dele e de cada um de nós, ao “ver” os lençóis, a mesa, o vinho, a casa em ruína… a mãe já falecida… E” ouvimos” o escaqueirar da mesa, “vemos” o vinho entornado na “ toalha branca”, lembrando o “sangue” dos nossos desgostos, entornado, inclusive, nos limpos panos em que dormimos…
Por toda a poesia de C.P , feita de Imagens- símbolo, repassa a angústia da transitoriedade da vida, o envelhecimento quotidiano e implacável, as “sombras” do nosso dia-a- dia, a Morte…
Veja-se, ainda:”Imagens que passais pela retina/ Dos meus olhos, porque não vos fixais? / que passais como a água cristalina/Por uma fonte para nunca mais…! / Ou para o lago escuro onde termina/ Vosso curso, silente de juncais (…) /”.
Viajou muito, o poeta, tendo vivido noutros países, como MACAU, por exemplo. Nunca deu muito nas vistas, mesmo quando andou em Coimbra. Foi a revista literária “ORPHEU” quem deu pela poesia diferente deste homem, que se exilou no Oriente. “Homem de escrita fina, refinada e um pouco difícil…”- afirma PAULO FRANCHETTI, in “DIMENSÃO LITERÁRIA.
Dos seus verdes anos, a escrita e a temática, demonstram influências notáveis: ANTERO DE QUENTAL, JOÃO DE DEUS e, sobretudo, CESÁRIO VERDE. Deste último, principalmente, nota-se a influência do recurso à mistura de sensações visuais, auditivas, gustativas, tácteis e olfactivas, que redundam em sinestesias vivíssimas, geradoras de um visualismo provocador de EMOÇÕES; e parece que cheiramos o vinho despejado, que ouvimos o escaqueirar da mesa, que vemos os lençóis brancos e a toalha suja desse vinho…
Alguns estudiosos consideram CAMILO PESSANHA um precursor do MODERNISMO pelos ares de cansaço, tédio, abulia em relação à decadência finissecular; mas é, particularmente, pelas primeiras atitudes poéticas de “fragmentação” do EU, que assim o consideram. Esse aspecto de poesia de fragmentação irá ser a génese dos heterónimos de FERNANDO PESSOA, que tratarei, brevemente, em várias secções, pela complexidade e riqueza temáticas.
A ÁGUA é um dos motivos poéticos mais recorrentes em C.P, até porque, se nos recordarmos do que tenho dito a respeito deste elemento da VIDA, é ele que sugere o passar dos dias, o fluir do tempo, o nosso envelhecimento… A água corre sempre, rejuvenesce sempre… Mas nós, humanos, vamos decaindo e andando para o NADA final, que é o culminar da nossa ligação com a NATUREZA. PROFUNDA AMARGURA…
Artigo, forçosamente, reduzido, dada a grandiosidade da obra do grande poeta.


Mealhada, Maio de 2012 (REP)
maria. elisa.ribeiro@iol.pt
http://lusibero.blogspot.com

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