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TRIBUNAIS
O Estado de direito no fio da navalha
José Ribeiro e CastroSeguir


24/1/2018, 6:48


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O cortejo de políticos, mais ou menos retirados, dedicados a empresas ou escritórios, opinando de modo alarmista e enviesado e exercendo pressão sobre o processo, deixa-nos ficar muito mal como país.



O julgamento da Operação Fizz que começou em Lisboa não é só um teste (e um desafio) à solidez das relações entre Angola e Portugal; é sobretudo um teste (e um desafio) à solidez do Estado de direito. Ambos os planos são importantes. Não podemos achar um mais importante do que o outro; mas não podemos deixar um na sombra por cuidarmos apenas do outro.


A atenção política e jornalística a respeito do caso tem-se focado no ângulo das relações Angola/Portugal. A atenção económica, também – é de presumir. E é natural que assim seja: um caso em que é suspeito, entre outros, uma figura como o Eng.º Manuel Vicente, personalidade relevante na elite dirigente angolana, ex-líder da Sonangol, ex-Vice-Presidente de Angola (dado como possível sucessor de José Eduardo dos Santos), actualmente deputado de relevo na Assembleia Nacional, não poderia deixar de incendiar a curiosidade, adensar as especulações e multiplicar as pressões. Não é de estranhar. Mas é de lamentar que, em Portugal, seja essa a abordagem quase exclusiva, apagando o outro plano, de grave risco para todos: o risco em que está colocado o Estado de direito.


Quem considere da mais alta relevância as relações entre Portugal e Angola só pode desejar que isto não estivesse a acontecer. Quem deseje que as relações entre angolanos e portugueses fluam e floresçam em clima de amizade franca, cooperação estreita e intercâmbio aberto só pode querer que esta prova não existisse. Mas, para que não estivéssemos confrontados com este transe, era essencial que não se tivesse gerado a suspeita de corrupção de um alto magistrado do Ministério Público. Não é uma questão de somenos. Como pode sugerir-se ao Ministério Público que ignorasse um caso de corrupção? Como ignoraria logo o Ministério Público a corrupção, possivelmente, de um dos seus?


O Presidente da República de Angola, João Lourenço, tem vindo a conduzir uma vasta agenda de mudança e de reformas, que gera compreensão e simpatia generalizadas dentro do país e internacionalmente. É muito importante acompanhar esse desenvolvimento da política angolana e significar apreço, apoio e aplauso por cada um dos passos que sejam dados e consolidados na rota de tornar Angola uma grande Nação democrática, com pleno Estado de direito, crescimento económico sólido e intenso, justa distribuição da riqueza, administração descentralizada e uma sociedade de bem-estar. Tudo o que possamos fazer para ajudar a esse caminho, apoiando os angolanos e as suas autoridades, é bem-vindo ao futuro.


É compreensível o mal-estar que as autoridades angolanas expressam perante este caso. Também elas, sem dúvida, desejariam que isto nunca tivesse acontecido. E é perfeitamente compreensível que o Presidente angolano dê voz a esse desconforto. Não poderíamos esperar outra coisa. Mas não é correcto dizer-se que a Justiça portuguesa disse que não confiava na Justiça angolana, assim como quem diz “nós somos bons, vocês não prestam”. Nunca tal coisa foi dita – tanto quanto sei, nem sequer foi sugerida. Seria uma enormidade intolerável. Não pode confundir-se um título de imprensa bombástico, escrevendo uma interpretação incendiária, com as posições escritas oficiais da Procuradoria ou do tribunal. E é muito mau que, em Portugal, vozes qualificadas e experimentadas da política ecoem, com falsidade, um juízo que nunca foi proferido, multiplicando pressões infundadas sobre os nossos magistrados e os nossos tribunais. Assim como é mau que, em Portugal, se acuse a Justiça portuguesa de negligenciar e ofender acordos internacionais celebrados no âmbito da CPLP, mostrando essas mesmas vozes enorme leviandade na leitura dos acordos e no relato dos factos.


Por que estaria a Justiça portuguesa a violar deveres de cooperação judiciária com Angola, ao não ter remetido à Justiça angolana o caso relativo ao Eng.º Manuel Vicente, e a Justiça angolana não teria violado esses mesmos deveres de cooperação judiciária ao não ter procedido à notificação que lhe foi solicitada? Face à recusa dessa notificação

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