quarta-feira, 4 de julho de 2012

REFLECTIR-SENDO...(artigo publicado, também, no Jornal da Mealhada, de 4 de Julho de 2012


DE TUDO, UM POUCO…

REFLECTIR-SENDO…

O meu “ quê” de proustiana leva-me, através da poesia e de outros momentos de escrita, como que a uma constante procura do meu tempo perdido nos anos, impossível de reencontrar, um tempo em que descurei o valor da minha palavra como meio de contacto comigo, para bem de outros. Outros eram, então, também, os objectivos do uso da Palavra.
Vou permitir-me dialogar comigo…assim…ao meu estilo, com a mesma preocupação de PROUST, na procura do seu tempo perdido, que nunca pôde encontrar porque ninguém o pode fazer.
Um ruído, quase poético, faz estremecer a espinha dorsal das folhas, permitindo o deslizar das gotas de orvalho, quando o sol da manhã se levanta, lentamente, irrompendo de um horizonte, algures entre o céu e o mar. Está dentro de mim, esse ruído …permanentemente… a procurar as respostas para as verdades que não encontro, como nenhum de nós pode encontrar. E no entretanto, através das árvores que estremecem de vento, vejo o colorido solar a banhar o planeta-vida. O vento ligeiro decompõe as nuvens em tufos de brancura, que se fixam, insidiosamente, na poeira da nossa mente; e porque nada é estável, nada é imóvel, tudo se move, em rapidez e triunfo, quando os raios quentes, alaranjados, abraçam as árvores, o mar e eu, que páro, a pensar. O pensamento adquire, pois, a mística beleza de cúpula de catedral e, em pose de meditação, pergunto-me se me devo perder por entre a música silenciosa da floresta, em peregrinação pelas margens dos regatos, repousando ao lado das ervas, unidas como amantes a transpirar o prazer de existir.
É esta a biblioteca mais credível da minha vida, quando me quero encontrar; fluxo fertilizador, ela impõe-se a tudo o que encontra pela frente pois o AGORA-É-SEMPRE-UM-HÁ-DE- SER…
O filósofo Schopenhauer (Danzig, 22 de Fevereiro de 1788-Frankfurt, 21 de Setembro de 1860) dizia que a vida é um pêndulo que oscila perpetuamente entre a ansiedade e o tédio e que é imperioso superar a falta do que se situa entre estes dois polos e preencher o Desejo; mas a verdade é que um desejo deixa de o ser, quando se realiza…
Consequentemente, o homem nunca se realiza, porque há sempre desejos por cumprir! Talvez por isso Camus tenha empreendido a “viagem” da Procura ao longo da sua grande meditação, que é essa obra, cansativa e apaixonante,“ EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO”. Pretende o autor mostrar-nos que essa obra não tem fim, como não o tem esta aprendizagem estafante de viver. E qual de nós não pensa para poder ver se aprende, mesmo-e sobretudo!-sem conversas filosóficas, a viver melhor? Aliás, temos um ditado que diz: “Aprender até morrer.”Cada um de nós tem o seu processo catártico de encontrar respostas; e fá-lo, meditando, quase sem querer. Afinal, somos os únicos seres dotados de pensamento! O que, diga-se de verdade, é um tremendo peso…Estamos condenados a uma eterna Procura dos segredos ocultos ou da verdade nunca encontrada, para nos projectarmos para além das dúvidas e das rotas de colisão com as ilusões.
Estará essa verdade nas sombras que perturbam? No espelho de alguma lenda que resistiu à voragem dos tempos, carcomido por manchas ácidas, contudo?
Uma melodia de odores espalha-se nesta cruzada de humores matinais, confundindo-se com acordes dos Quartetos de BEETHOVEN. A música permite-me estar-comigo-fora-de-mim…É um modo de me procurar, através de florestas, rios, mares e desertos, sem ter que responder “às esfinges”, para as quais não tenho sapiência…
Uma chávena de café fixa-me…Algures, no meio da minha hora meditativa, chilreiam os pardais, desabrocham as flores, rebentam novos ramos de árvores…E torna-se difícil descrever as angústias do mundo onde EU-EXISTO-E-SOU…e tenho medo que o bater das asas de uma borboleta, em horizontes longínquos, faça estremecer o planeta com a força de um pensamento incorrecto…
A verdade é que o viver é assim…uma coisa sobrepõe-se imediatamente a outra num contínuo e sistemático acto de mudança, sem dar tempo a que nos concentremos numa única dúvida, numa única verdade, que se não sabe qual é. São tantos os “túneis labirínticos” para os quais procuramos saídas…Procuramos, por isso, esgueirarmo-nos para os campos de papoilas no meio dos trigais, onde pétalas flutuam e aves cantam suaves madrigais.
A toda a hora mergulho no véu da infância, que estremece, quando lhe toco. É antes da minha infância que começam as dúvidas, as procuras…
Os abismos verdes das algas do mar são tão profundos! mas deixo-os para os peixes errantes que não pensam e enterro os pés no areal luminoso da vida onde as conchas repousa , inconscientes dos ventos que sopram as poeiras da mente.

Comigo, o poema de Mário Dionísio, “ARTE POÉTICA”:

“A poesia está na vida…No grito do rapaz apregoando jornais…no riso da loira da tabacaria…na doca…no beijo que se trocou…A poesia está em tudo quanto vive…na luta dos homens…nos olhos abertos para o amanhã.”

Até sempre, amigos leitores.
Mealhada, 1 de Julho de 2012
http://lusibero.blogspot.com
lisitarodrigues@gmail.com
Maria Elisa Ribeiro

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