A arte pela vida
Como escritor, José Régio é considerado um dos grandes criadores da moderna literatura portuguesa. Refletiu em toda a sua obra problemas relativos ao conflito entre o Homem e Deus, o artista e a sociedade, o Eu e os outros. Construiu a sua poderosa arte poética e ficcional num tom misticista e num intimismo psicologista com que analisava a problemática das relações humanas e da solidão do indivíduo, procedendo ao mesmo tempo a uma dolorosa autoanálise.
Apesar do regime conservador de então, Régio manteve-se fiel aos seus ideais de socialista cristão e teve durante a sua vida uma participação ativa, embora moderada, na vida pública, sem na sua escrita condescender com uma mera contestação panfletária. Devido à sua posição independente polemizou acerbamente com escritores oriundos do neorrealismo, do concretismo, do experimentalismo e do formalismo, defendendo o ideal presencista de uma arte pela vida, fortemente individualista e que expressasse com sinceridade as mais íntimas emoções do artista - nas quais atribui especial relevo aos dilemas morais e à indagação religiosa. Mas se a inspiração do artista fosse predominantemente social, haveria que expressá-la com independência de quaisquer programas políticos (e Régio assim o demonstrou na sua poesia social de Fado, A Chaga do Lado e Cântico Suspenso), o que representou um desafio muito contestado naquela época de estritos alinhamentos.
Os cafés e as tertúlias
Em Coimbra, no Café Central, reunira-se o grupo de jovens da Presença, incluindo João Gaspar Simões e Branquinho da Fonseca, "cenáculo onde Régio realmente pontificava".[9] Depois, nos seus anos de Alentejo, Régio presidira a nova tertúlia no Café Central, agora de Portalegre, que integrava entre outros o médico Feliciano Falcão, o pintor Arsénio da Ressurreição e o capitão Carlos Saraiva e por onde passaram, em cumprimento do serviço militar no Quartel de São Francisco, os milicianos David Mourão-Ferreira (março a junho de 1952) e Eugénio Lisboa (fev. 1954 a fev. 1955).
Já nos últimos anos da sua vida, Régio foi de novo a figura tutelar de uma tertúlia que reunia semanalmente no Diana-Bar da Póvoa de Varzim, ou no restaurante Marisqueira em A-Ver-o-Mar (o "grupo dos sábados") a que compareciam regularmente Manuel de Oliveira, Luís Amaro de Oliveira,[10] João Francisco Marques, Orlando Taipa, Flávio Gonçalves e Pacheco Neves e a que se juntou Agustina Bessa-Luís.
Régio coleccionador e antiquário
Durante o tempo que passou no Alentejo, e para apoiar as suas apetências de coleccionador, Régio desenvolveu um pequeno negócio de comércio e restauro de antiguidades, e empregou artífices por sua conta para recuperar as suas próprias peças e aquelas que vendia.
Veio assim a reunir uma extensa e preciosa coleção de antiguidades e de arte sacra alentejanas que vendeu à Câmara Municipal de Portalegre em 1964, com a condição de esta comprar também o prédio da pensão onde vivera e de o transformar em casa-museu. Providenciou de igual modo para a sua casa de Vila do Conde e hoje em dia ambas as casas de Vila do Conde e de Portalegre são casas-museu onde se expõe um rico acervo de arte sacra e de arte popular, as duas predileções artísticas de Régio.
Colaborações artísticas e prémios de homenagem
Alguns dos seus livros foram ilustrados por seu irmão, o pintor Julio/Saúl Dias, outros pelo próprio Régio, entre uma plêiade de capistas e ilustradores que se inspiraram na sua obra, incluindo Bernardo Marques, Câmara Leme, Lima de Freitas, Stuart Carvalhais, entre muitos outros.
Grande apreciador de cinema, colaborou ativamente com vários cineastas, sobretudo com Manoel de Oliveira que realizou filmes com a sua assessoria e outros inspirados na sua obra.
Em 1965 Amália Rodrigues gravaria 'Fado português' de José Régio, num LP que receberia o nome da composição de abertura: Amália Rodrigues – Fado português.
Recebeu em 1961 o Prémio Diário de Notícias por As monstruosidades vulgares; em 1963 o Grande Prémio de Novelística da Sociedade Portuguesa de Escritores por Há mais mundos; em 1970, a título póstumo, o Prémio Nacional de Poesia da Secretaria de Estado da Informação e Turismo (SEIT) por Música Ligeira.
Vida pessoal
Foi irmão do poeta, pintor e engenheiro Júlio Maria dos Reis Pereira, que como artista plástico se assinava Julio e como poeta Saúl Dias. Teve mais dois irmãos que se dedicaram às artes plásticas, Apolinário José (1917-2000) e João Maria (1922-2009) e ainda um outro, Antonino Maria (1905-1965), que emigrou jovem para o Recife, Pernambuco. Duas irmãs morreram cedo. Nunca se casou, mas não era celibatário: do seu sentimento amoroso dá conta o seu Soneto de Amor.[11]
Fumador inveterado, veio a morrer vítima de ataque cardíaco.