sexta-feira, 30 de julho de 2021

DiMaio - Ave Maria di Caccini (Arr. Dardust) [Official Video]

'Ave María' de Gounod interpretado por Ainhoa Arteta

A LER...SABER É ÚTIL

 In pt.scribd.com/document:

D'os lusíadas à mensagem: Prado coelho/Camões/ Pessoa
1.
1. 1 D' «Os Lusíadas» à «Mensagem» Os poemas de Camões e de Fernando Pessoa sobre Portugal situam-se respectivamente no início e na fase terminal do longo processo de dissolução do império. Daí notáveis diferenças, a par de afinidades sensíveis. Ao gizar a Mensagem, não só Fernando Pessoa tinha Os Lusíadas no âmbito das suas referências culturais como nele desembocavam os rios subterrâneos duma Weltanschauung (mundividência) e duma mitologia colectivas vindas de Camões e do humanismo quinhentista. Ambos se "mostram impregnados duma concepção mística e missionária da História portuguesa (talvezseja melhor dizer missionante, para evitar equívocos). D. Sebastião, n'OsLusíadas, é um enviado de Deus incumbido de alargar a Cristandade: «Vós, ó novo temor da Maura lança./'Maravilha fatal da nossa idade,/Dada ao mundo por Deus, que todo o mande,/Para do mundo a Deus dar parte grande» (I, 6). Na Mensagem, Portugal é um instrumento de Deus, a História pátria obedece a um plano oculto, os heróis cumprem um destino que os ultrapassa: «Fosse Acaso, ou Vontade, ou Temporal/ A mão que ergueu o facho que luziu,/Foi Deus a alma e o corpo Portugal/Da mão que o conduziu». " Se, n'Os Lusíadas, o nosso país é «qual cume da cabeça/Da Europa», na Mensagem, em descrição semelhante, Portugal é o seu rosto, e a diferença reside na personificação da Europa, figura feminina, de«olhos negros», «românticos cabelos», o rosto apoiado na mão direita, atitude estática, pensativa. Haverá! aqui sugestões do célebre soneto de Unamuno dedicado a Portugal, aquele que começa «Del Atlántico mar en las orillas»;também o Portugal de Unamuno está simbolizado numa mulher que, descalça na
praia, em frente do Atlântico, olha absorta em nostalgia e esperança. (…) Tanto
Camões como Pessoa, cantores da pátria, são poetas da ausência. Poetas do que foi ou do que poderá vir a ser. Dum amor que ou se refugia na memória ou,revigorado, se traduz na vibração dum apelo. Mas as situações divergem, um intervalo multissecular tinha de separá-los. No Camões épico predomina o elemento viril - a viagem, a aventura, o risco. Tradicionalmente, a mulher é a que fica, esperando, imóvel, na felicidade e no sonho do regresso: como Pessoa e as figuras em que se desdobra, de olhos fitos no indefinido. Homem de acção, e não só de inteligência, Camões ainda conheceu o império no concreto da sua grandeza e das suas misérias, era-lhe fácil ainda ter esperança. O D. Sebastião a quem se dirige é um jovem de carne e osso, vale a pena mostrar-se; exibir os seus préstimos, para que o Rei o distinga, confie nele, se lance na conquista do Norte de África levando-o consigo. Outro império terreno ainda parece possível, «como apressadamente vaticina», o próprio Velho do Restelo sanciona a aventura, e Camões prepara-se para cantar a nova empresa. O D. Sebastião da Mensagem,elaborado longamente pelo sebastianismo e pela humilhação, esse é o Encoberto,o Desejado, uma sombra, um mito. Pessoa sobrevive na aridez dos «dias vácuos», já lhe faltam razões para acreditar, o seu desejo está no limite, calcinado pela espera de quatro séculos. Refaz o trajecto camoniano da evocação para a invocação. Mas, perante o Rei ausente, que talvez nunca mais regresse da sua ilha encantada, é como se fosse o menino órfão, abandonado, que, na desolação da sua própria intimidade, dirige à mãe uma derradeira súplica: «Screvo meu livro à beira-rnágoa./Meu coração não tem que ter.! I Ah, quanto quererás, voltando /Fazer minha esperança amor?/Da névoa e da saudade quando?/Quando, meu Sonho e meu Senhor?» (Terceiro d'«Os Avisos»). O seu enorme anseio tornou-se insuportável, só pela palavra poética ilude o silêncio, o vazio. Em Camões, põem-se no mesmo plano a memória e a esperança. Em Pessoa, não, porque o objecto da esperança se transferiu para o sonho, a utopia, e daí uma concepção diferente de heroísmo. Pessoa identifica-se com os heróis da Mensagem, ou neles se desdobra, num processo lírico- dramático. O amor da pátria converte-se numa atitude metafísica definível pela decepção do real, pelo anelo de absoluto, por uma loucura consciente, pela busca do que não existe, pela demanda que só tem finalidade em si própria, porque atingir é estagnar, ser vencido.
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Texto de António Lobo Antunes

 (SEM FOTO)

Todos nós temos na vida uma ilusão mais querida
Ontem, já à mesa, perguntei à minha mãe como me chamava e, na cara dela, uma espécie de sorriso vazio, perplexo
– Como te chamas?
em busca do meu nome, que se vai diluíndo, a pouco e pouco, em si. Repetiu
– Como te chamas?
do seu deserto interior onde apenas, numa vaga escuridão, silhuetas imprecisas, distantes, que não reconhece
– Como te chamas?
suspensa num silêncio oco. Pergunto
– Como se chama o meu pai?
os seus dedos encontram os meus no braço da cadeira
– O teu pai?
Levaram-na ao cabeleireiro porque vinham os filhos jantar, puseram-lhe um anel no dedo, um broche no peito. Quando morrer vende-se esta casa e a casa da praia, a família acaba. O meu pai e o meu irmão Pedro morreram, cada vez me sinto mais entre destroços. Dentro em pouco estaremos distantes uns dos outros, na mesma cidade e distantes. Um telefonema de vez em quanto, raros encontros, esta sombra, que foi a nossa mãe, deixará de unir-nos. De súbito pronuncia o meu nome baixinho
– António
e afasta-se de novo, marchando no seu deserto, indiferente. O
– António
dela não tem o menino que fui dentro, o eco de um eco apenas, um ventinho sem significado remexendo poeiras, os dedos roçando nos meus, pequeninos, suaves. Porque é que deixou que isto acontecesse, mãe, como se ela tivesse culpa de se ir afastando de si mesma, da gente.
– Chamo-me António e o meu pai João
e o que parece um esboço de sorriso num esboço de cara. Recordo o meu pai morto na clínica, o seu perfil indiferente. Recordo o Pedro a acender um charuto. Recordo a minha mãe a cantar
Todos nós temos na vida
Uma ilusão mais querida
Uma ilusão de amor
e não sei se me comovo. Parece-me que mais surpresa do que emoção. Era afinada, ela, gostava de a ouvir. Dava-nos injeções quando estávamos doentes, punha-nos supositórios. O suplício
– Chega-te aqui à luz
de me cortar as unhas
– Não te mexas
e o meu pânico de ficar sem dedos, a tesoura, apesar de diminuta, atroz. Medo do escuro, gritar
– Mãe
e ela, invisível, longíssimo
– Que maricas.
Lembro-me de lhe afirmar, criança
– Sou escritor, sabia?
e a minha mãe um riso divertido, ela que ria pouco, a fitar-me de cima para baixo, onde eu existia
– Já a formiga tem catarro
e, passado um bocadinho
– Escritor, imagine-se.
O meu pai, à mesa
– Com que então escritor?
A cheirar a tabaco de cachimbo e a brilhantina. Não quero perder isto, não quero perder tudo isto.
Todos nós temos na vida
Uma ilusão mais querida
Uma ilusão de amor
e, em lugar da ilusão de amor, silhuetas imprecisas, distantes. Esta não é a minha mãe, estes não são os meus irmãos, este não sou eu. E a casa, meu Deus, tão velha agora: esta não é a minha casa, é o sítio onde a minha mãe tropeça, com uma senhora a tomar conta dela e a dar-nos notícias
– Um bocadinho confusa, coitada
e não é que esteja confusa, minha senhora, eu é que não entendo. Já não existe a capoeira, já não existe o limoeiro, o quarto onde dormi tantos anos com o João, o Nuno, de babete, abraçado a um Pluto de borracha. O meu pai no escritório, ao microscópio. Cigarros às escondidas. Uma cobra no jardim. O vizinho polícia
– Tão bonitos, tão loiros
o louco sempre com gaiolas de passarinhos, a taberna na rua que conduzia ao cemitério e que se chamava Na Volta Cá Os Espero. Houve protestos e passou a chamar-se A Tradicional Da Volta, eternamente cheia de bêbedos aos gritos, aos abraços, a sentarem-se no chão.
– A maré está alta
resmungavam eles
– Hoje a maré está alta
E nós mudávamos de passeio, assustados. A mercearia do Careca. O senhor Jardim, distinto, na drogaria, tão simpático. A empregada que me roubou o fio de oiro com a medalhinha de Santo António que o meu avô me deu em Pádua. Ao protestar gritou-me
– Vá meta isso no cu da sua mãe
e eu fui. Mas o fio desapareceu para sempre, conforme o meu nome desapareceu para sempre da cabeça dela. Silhuetas imprecisas, distantes. Chamo-me António. Julgo que me chamo António, quieto no meu deserto, indiferente. Quando acabar esta crónica levanto-me e, como a minha mãe, principio a andar ao acaso, cantando para dentro
Todos nós temos na vida
Uma ilusão mais querida
Uma ilusão de amor
Enquanto um miúdo loiro me observa em silêncio, maravilhado.
António Lobo Antunes

quinta-feira, 29 de julho de 2021

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segunda-feira, 26 de julho de 2021

ENYA / EL SUEÑO DE LAS HADAS

Jonas Kaufmann - Parla più piano - Live

Abrazáme así

Saudação de Bom Dia!


 

Poema

 






POEMA

 

DIÁLOGOS DE SOLIDÃO

 

Urgente se torna ,

ao fim do dia,

despir as vestes e pendurá-las num armário

onde se fecham odores a devassar a intimidade que envergámos,

na incomensurável verdade da realidade-corpo-vivo-dos-dias-no-tempo.

 

A noite fecha-se em torno de todos os ritos de passagem e sentimo-nos

como comboio que vai partir,

 rumo a interrogações seculares.

 

Iremos a promontórios românticos

desenhados perto do sufoco da abóbada celeste,

onde a solidão encontrará todas as outras solidões

de seres e de aromas

que vão entrar em diálogo

de circunstância,

no silêncio do firmamento iluminado pelas mãos dos deuses dos mundos

criados, nunca entendidos…

 

E são belas, as Horas, só por existirem comigo dentro delas!

 

São belos os dias que nos respiram num sopro divino que galga a força do tempo

no -vento-de-existir,

mesmo quando inalamos dúvidas-sem-resposta que não a do sol,

das aves e da luz do dia,

 em que envergamos vestes num equilíbrio

de proporções-tessituras-de-harmonia,

onde versões cristalinas do Viver avançam em sintonia com a música-do-Existir.

 

Inquietantes visões nocturnas do despir o corpo no vestir a alma,

em equilíbrio-do-desequilíbrio-das-emoções…

São tantas as palavras penduradas no ânimo irrequieto dos-cabides-da-vida!

 

Adio o sono…

 

Centro-me no silêncio azul de um mar a brilhar rasgos de luz estrelada,

                                                                      numa poesia de espuma libertadora

                                                                                às voltas numa onda-de-madrugada…

 

 

 

Maria Elisa Ribeiro

 

 

domingo, 25 de julho de 2021

POEMA

 POEMA

HORA VIGÉSIMA QUINTA
De nossas mãos entrelaçadas
apenas o nó desfeito de um abraço, em plena noite ficou.
As estrelas deixaram de nos iluminar
e perderam-se em cavalgadas loucas, a iluminar a superfície lisa
das águas do mar.
Com um fragor semelhante a uma pedra rolante, que se atira
da colina,
uma lágrima rolou…luminosa…quente…pequenina…
Sinto-me, hoje, uma ponte entre o Passado ausente
e este Presente-Presente, ansiosa por me perder
nas ondas revoltas daquele nosso Antigamente.
Sangram-me os dedos por teimar em escrever poemas-
-tantos poemas!-onde te encontras sem que te veja…
Beija-me, agora, o silêncio das palavras que se calam,
quando as não consigo escrever,
porque vivem nesta memória inquieta da qual não devo falar,
e onde- estou-a-acontecer.
Será numa Hora vigésima quinta ,
que se dará o meu renascer?
Saberei se podes acontecer-me, nas águas
que habitam meu-rio-a-fluir?
O mar continua a bramir em ondas de espuma a ferver.
E a montanha dos ventos ululantes continua a brilhar
à luz da Lua distante,
de uma hora vigésima quinta,
- vigésima sexta, vigésima sétima, do mundo-a-viver…
Maria Elisa Ribeiro
JNH/018
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