O sol já ia alto e Alice sentia a pele do rosto e dos braços a ficar muito quente, também se sentia muito cansada de caminhar. Decidiu procurar um lugar para se sentar a descansar. Na berma do caminho, uma frondosa árvore, estendia os seus ramos de maneira convidativa, era o local ideal para se abrigar do sol inclemente. Procurou então uma pedra adequada para se sentar um pouco, alisou o vestido e o avental e com um suspiro de satisfação, sentou-se protegida pela sombra que a grande árvore projetava.
Assim que acabou de pousar o ramo de rosas que levava, uma voz ríspida perguntou-lhe:
-Quem és tu, criatura?
Sobressaltada com a pergunta intempestiva, Alice olhou em redor para tentar perceber quem se lhe dirigia, de forma tão pouco calorosa. Avistou então, sentada sobre um grande cogumelo, uma lagarta com ar altivo.
- Bom dia! – exclamou Alice de forma amigável – Eu sou a Alice e, a senhora quem é?
A lagarta continuava a olhar fixamente para Alice, sem se dignar a responder e tampouco a retribuir-lhe a saudação. “Que criatura estranha e arrogante”, pensou Alice, enquanto a lagarta continuava a polir o seu violoncelo, tarefa à qual, dedicava toda a atenção. Apenas interrompera esse trabalho, para interrogar Alice. Algum tempo depois, voltou a fazer mais uma pergunta:
- De onde vens e para onde vais?
Alice sentiu uma enorme vontade de lhe responder "que ela não tinha nada com isso”, mas enchendo o peito de ar e tentando manter a compostura perante tanta impertinência, resolveu responder-lhe educadamente:
- Vou visitar o coelho branco. Este é o caminho correto?
-É – respondeu mostrando total indiferença por Alice e continuando a polir um instrumento que já se encontrava reluzente.
-Obrigada, logo que descanse mais um pouco seguirei o meu caminho – Alice não se encontrava à vontade com a presença de uma lagarta que só a questionava sem sequer se mostrar minimamente interessada nela.
- De onde vens com todas essas rosas? – voltou a perguntar a lagarta antipática.
- Venho de visitar o jardim da Rainha de Copas – mal terminara de falar, recordou-se que a aterradora Rainha conseguia ser menos arrogante e altiva do que aquela lagarta, ou seria apenas impressão sua?!
- Essa rosas, certamente, não foram uma oferta da Rainha! – exclamou a lagarta, soltando uma gargalhada irónica.
Alice sentia-se furiosa, afinal sentara-se ali para descansar e tinha encontrado aquele ser tão desagradável. Agarrou nas rosas e levantou-se, disposta a seguir o seu caminho.
- Se queres mesmo visitar o teu amigo coelho, vais ter de diminuir de tamanho…senão como vais entrar na casa dele?
Alice ficou um pouco confusa e surpreendida com a pergunta, não se tinha lembrado que para visitar o coelho teria de se adaptar a uma realidade diferente da sua.
-Como posso diminuir o meu tamanho? Como posso voltar depois a ficar com o meu tamanho normal? – perguntou Alice inquieta porque não tinha pensado naquele detalhe. Tinha de estar disposta a transformar-se e a adaptar-se para atingir o seu objetivo.
Vendo o ar preocupado de Alice, a lagarta soltou outra gargalhada trocista que fez Alice corar de raiva e frustração. Aquela lagarta estava a enervá-la com a sua impertinência.
-Todos nós temos que estar preparados para mudarmos quando isso for necessário. Eu, por exemplo, daqui a umas semanas deixarei de ser uma lagarta para me tornar numa bela borboleta! – exclamou com vaidade, a orgulhosa lagarta que estava convencida que tudo sabia e, que Alice era uma tonta ignorante.
“Borboleta, pois sim, com toda essa arrogância deverias era transformar-te num besouro”, pensou Alice contendo o riso, estava farta daquela lagarta. Como se lhe estivesse a ler os pensamentos, no que respeitava aos seus maus modos, a lagarta acrescentou com voz menos autoritária e muito mais dócil:
- Parte um pouco deste cogumelo onde estou sentada.
Alice obedeceu e partiu um pedaço do cogumelo.
-Agora parte em pequenos pedaços e guarda-os no bolso do teu avental! – ordenou – Quando quiseres diminuir de tamanho, come um pedacinho do cogumelo que partiste e quando quiseres voltar à estatura normal, volta a comer outro pedaço!
Alice guardou os pedaços no bolso como a lagarta lhe tinha dito para fazer. Apertou as rosas de encontro ao peito e exclamou:
- Atá à vista D. Lagarta! Quando nos voltarmos a encontrar, espero que se tenha tornado numa linda borboleta, assim como deseja!
- Assim será! - exclamou convencida.
“Ou um besouro irritante”, pensou Alice rindo disfarçadamente. Distraída com os seus pensamentos ainda focados naquele encontro tão peculiar, Alice não se deu conta que alguém a seguia muito discretamente.
Com o seu eterno sorriso, o gato Cheshire observava Alice, empoleirado no ramo de uma árvore. Quando Alice finalmente o viu, perguntou-lhe:
- Andas a seguir-me, gato?
-Eu, que ideia! -respondeu rindo.
-Não esperava encontrar-te duas vezes no mesmo dia – disse Alice, suspeitando que o gato tinha tanta curiosidade nela, como ela tinha nele.
-Pois, parece que vamos na mesma direção – respondeu invasivo, mantendo-a na dúvida se estaria ou não a segui-la.
Alice manteve-se em silêncio por alguns minutos, mas ao contrário do que podia esperar, o gato não desviou o olhar nem tampouco deixou de sorrir para ela.
-Gostaste do teu ultimo encontro? – perguntou sem que Alice pudesse entender se ele estava a troçar dela ou, se estava com genuíno interesse no que ela tinha para dizer.
- Não gostei nada! – exclamou Alice, visivelmente aborrecida.
- E que lição aprendeste agora? – perguntou curioso.
- Aprendi tudo aquilo que não devo de fazer quando encontro alguém – respondeu Alice com amargura.
- Como assim?
- Aprendi que não se deve de falar para ninguém, com ares de superioridade, mas com respeito. Nós nunca sabemos tudo, nem tampouco os outros são totalmente ignorantes.
- Que mais?
- Achas pouco, gato! Faço-te a vontade, já que queres saber, aprendi que tenho de manter a calma, especialmente na presença de lagartas arrogantes. Mostrar sempre humildade, ser paciente e saber quando devo voltar costas e vir embora. Talvez se a voltar a encontrar, ela se tenha tornado uma borboleta simpática!
O gato soltou uma das suas risadas habituais e disse:
- Todos precisamos de num momento ou outro nos transformar e principalmente estarmos dispostos a isso. Como eu, queres ver?
Assim que acabou de falar, o gato desapareceu, permanecendo apenas o seu sorriso, o qual acompanhou Alice por mais algum tempo, até que desapareceu também.
"As maravilhas do Pais de Alice"
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