quarta-feira, 6 de setembro de 2017


OPINIÃO
O disfarce e a circulatura do quadrado


Em Educação, as medidas de política têm estado demasiado ligadas à ideologia dos grupos dominantes. Melhor dizendo, aos convencimentos dos que, em cada momento, governam em nome desses grupos.
23 de agosto de 2017, 6:30
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A interacção e a interdependência das sociedades modernas são cada vez maiores e provocam um interesse crescente pelos instrumentos que influenciam os seus diferentes sistemas. A Saúde, a Justiça, a Educação e a Economia, para citar apenas as áreas que de modo mais evidente marcam a nossa qualidade de vida, estão sob escrutínio constante de instrumentos de comparação e de grupos de pressão, que nos dividem entre “bons” e “maus”, segundo encaixemos ou não no que determinam ser politicamente correcto. No contexto da discussão pública, tais realidades acabam por se impor e contaminar a análise de outros factores.
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Em Educação, as medidas de política têm estado demasiado ligadas à ideologia dos grupos dominantes. Melhor dizendo, aos convencimentos dos que, em cada momento, governam em nome desses grupos. As últimas alterações que o sistema de ensino sofreu oscilaram entre concepções anglo-saxónicas, de raiz empirista, e ideias construtivistas, de inspiração piagetiana. Estas, hipervalorizando as ciências da Educação. Aquelas, hipervalorizando o conhecimento. E quando novos líderes recuperam medidas de líderes passados, que a prática mostrou estarem erradas, contam sempre com o apoio dos prosélitos da tribo, convenientemente esquecidos das evidências que viveram. Muitos deles são autores, nas redes sociais, quase sempre sob anonimato, de intervenções onde a injúria substitui a troca civilizada de argumentos e falseia a percepção do que se discute. Nesta espécie de bordéis de cobardes, a ignorância é o menos. O mais é a subserviência infame ao interesse do momento. O mais é impor como politicamente correcta uma visão ideológica que já foi testada e falhou. Assim vamos, em meu sentir, no prólogo de mais um ano escolar, sob o policiamento disfarçado do pensamento livre, rumo a uma pedagogia totalitária.

Começou o disfarce com uma revisão curricular que, oficial e centralmente, não existe. Com efeito, são algumas escolas que poderão alterar 25% do currículo, sem que, centralmente, os programas tenham sido alterados e embora os professores só devam cumprir, desses programas, o que as “aprendizagens essenciais” fixaram, em híbrida convivência com as metas de Crato, que não foram explicitamente revogadas. Esta circulatura do quadrado será operada por artistas das 236 escolas que se alistaram na experiência pedagógica da “flexibilidade curricular”. E continuou o disfarce com o secretismo que envolve a coisa: os pais não tiveram o direito de saber se a escola onde iriam matricular os filhos estava ou não envolvida na experiência; e agora, depois da lista publicada, não se sabe que turmas virão a estar envolvidas, muito menos os critérios que ditam a escolha; todos os pormenores operacionais pertencem ao obediente e venerador corpo de directores e aos comissários da modernidade do século XXI, enquanto, como convém, a generalidade dos professores do século XX está de férias.
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