sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Poema de Vitorino Nemésio(1901-1978)

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Vitorino Nemésio, VERBO E ABISMO



VERBO E ABISMO

Já da vaga vocálica dependo
Como a alga que a onda leva à areia:
Mas eu mesmo, que a digo, mal entendo
A voz que clama a minha vida e a enleia.

Se intervenho no som gratuito, ofendo
Seu sentido secreto e íntima cheia:
Transtornado por ela, emendo, emendo,
E é ela que me absorve e senhoreia.

Verbo ao abismo idêntico, toado
Sobre os traços de fogo que precedem
A presença de Deus no monte irado,

Ao teu sopro de amor as vozes cedem
O que a morte decifra e restitui
Ao espírito liberto do que fui.

Vitorino Nemésio, O Verbo e a Morte, Lisboa, Moraes Editores, 1959

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