A PRIMAVERA
VIRÁ...
Quando o inverno chegar, de lábios roxos de frio,
ventos ásperos e vadios passarão as mãos sobre as searas
e levarão para outros longes o trigo que se perdeu
pela planície dourada, em pousio.
As nuvens cinzentas dos escuros céus
esvaziarão potes de água sobre pomares
e baldios.
Os pássaros, que tudo sabem das tempestades
na alma da terra,
baterão as asas e rumarão ao sul do mundo
onde o tempo estará em calma.
Eu, ficarei…
Irei apanhar papoulas rubras que resistam
à fúria dos ventos
e aos incontáveis banhos de água.
O sol, sem forças para nos dar forças, sorrirá
de vez em quando, à casa desprotegida do vale,
frente a todos os distúrbios do tempo, como é natural.
Dentro dela, contudo, haverá sonhos e alegrias
das primaveras já distantes, vividas noutros dias
de outras primaveras, passadas em harmonia
pelos dedos das nossas mãos,
em palavras que, à lareira, nos aqueciam o coração.
Lá estarão, de certeza, os nossos livros, deitados
por todos os recantos, meio abertos-meio fechados
a confirmar que,
nem todo o nosso
tempo era dedicado a lê-los.
Lá virá , todos os anos, uma nova primavera…
Virá?
Se sentirmos o cheiro do alecrim dos campos, virá…
Se virmos as flores em botão, a reflorir, virá…
Se as figueiras e as amendoeiras florirem…oh, sim que virá!
Se o sol rir, descarada e abertamente,
e as sementes abrirem o útero da terra,
saberemos, então, que talvez venhamos a ler
todos os livros que deixámos, por lá, deitados pelo chão…
Maria Elisa Ribeiro
NOV/015
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