Só há oligarcas na Rússia?... Ler a opinião de Yanis Varoufakis:
“Porque parar nos oligarcas russos?
Embora haja boas razões para nos concentrarmos no dinheiro russo, agora que as bombas russas estão destruindo cidades ucranianas, é intrigante que apenas os bilionários russos sejam chamados de oligarcas. Por que a oligarquia, que significa governo (arche) de poucos (oligoi), é considerada um fenômeno exclusivamente russo? Não serão os príncipes sauditas ou dos Emirados Árabes oligárquicos? Será que os bilionários americanos, como os que agora se amontoam para comprar o Chelsea FC, contrabandeiam menos dinheiro para fora de seu país do que seus homólogos russos, ou têm menos influência política? Será que usam tal poder melhor do que os russos?
Os 0,01% mais ricos da Rússia (o 1% no topo do 1% no topo) retiraram cerca da metade de sua riqueza, cerca de 200 bilhões de dólares, da Rússia e esconderam-na no Reino Unido e em outros paraísos. Ao mesmo tempo, os 0,01% mais ricos da América retiraram cerca de 1,2 trilhão de dólares dos Estados Unidos, principalmente para escapar do pagamento de impostos. Assim, em termos de magnitude, cada dólar que os plutocratas russos escondem no estrangeiro para escapar da fiscalização corresponde a 10 dólares escondidos pelos plutocratas americanos.
Quanto à relativa influência política dos bilionários russos e americanos, não está de modo algum claro quem tem mais. Embora não haja dúvida de que vários oligarcas russos sejam próximos do presidente Vladimir Putin, este tem mais controle sobre eles do que o governo americano sobre seus bilionários. Desde a decisão de 2010 da Suprema Corte dos EUA, que confere às empresas o direito de doar aos políticos como se fossem pessoas, os 0,01% mais ricos da América foram responsáveis por 40% de todas as contribuições de campanha. Isso tem provado ser um excelente investimento na preservação da riqueza.
(…)
Então, se os bilionários não russos são também oligarcas, será que a ênfase exclusiva do Ocidente nos russos significa que “nossos” oligarcas, e os que são nutridos por nossos aliados, são de algum modo melhores? Aqui estamos pisando num terreno ético traiçoeiro.
Argumentar que os bilionários sauditas por trás de uma década de devastação do Iêmen são “melhores” do que Abramovich é um convite ao escárnio. Vladimir Putin se sentiria satisfeito se ousássemos afirmar que os magnatas do petróleo norte-americanos, que colheram um inesperado resultado da invasão ilegal do Iraque pelos EUA e pelo Reino Unido, eram moralmente superiores aos proprietários da Rosneft e Gazprom. Com certeza, os oligarcas de Putin fazem vista grossa sempre que um corajoso jornalista é assassinado na Rússia.
Mas, enquanto isso, o fundador do WikiLeaks, Julian Assange, definha numa prisão de alta segurança no Reino Unido, em condições que beiram a tortura, por ter exposto os crimes de guerra dos países ocidentais após sua invasão ilegal do Iraque. E como reagiram os oligarcas e governos ocidentais quando seus parceiros comerciais sauditas desmembraram o colunista do Washington Post, Jamal Khashoggi?”
(…)
Talvez o único lado positivo da tragédia ucraniana seja o fato de ter criado uma oportunidade de fiscalizar os oligarcas não só com passaportes russos, mas também seus homólogos americanos, sauditas, chineses, indianos, nigerianos, e, sim, gregos. Um excelente lugar para começar seria com as mansões londrinas que a Transparência Internacional nos diz que se encontram vazias. Que tal entregá-las aos refugiados da Ucrânia e do Iêmen? E, já que falamos nisso, por que não entregar o Chelsea FC aos seus torcedores.”
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