"As minhas palavras têm memórias ____________das palavras com que me penso, e é sempre tenso _________o momento do mistério inquietante de me escrever"
quinta-feira, 25 de setembro de 2014
O ministro da Educação de Portugal: O inimigo público da Educação e dos Professores! (artigo do Pro. Dr. Santana Castilho)
O absurdo de um matemático de ética trôpega
In JN-Prof. Dr. Santana Castilho
24 de Setembro de 2014 às 8:36
"Na véspera da data fixada para o início do ano lectivo faltavam nas escolas
cerca de 3500 professores. Estes docentes podiam e deviam ter sido colocados a
tempo de participarem nos trabalhos preparatórios do ano que se ia iniciar. Mas
assim não foi, por incúria do Ministério da Educação e Ciência. Na mesma altura
começou, reiteradamente, a ser denunciado o erro que está na origem da
ordenação dos docentes que concorreram à Bolsa de Contratação de Escola,
processo através do qual os estabelecimentos de ensino com contratos de
autonomia ou estatuto TEIP (Território Educativo de Intervenção Prioritária)
poderiam contratar os professores em falta.
A ordenação em causa foi feita através da média aritmética obtida pela
consideração de duas notações ponderadas: a classificação profissional dos
candidatos e a sua avaliação curricular. Só que o ministério cometeu um erro
básico, inaceitável, daqueles que nenhuma contrição, por mais beata ou pública
que seja, lava: somou, sem prévia conversão a uma mesma escala, duas grandezas
expressas em escalas bem diferentes. Assim como se, no altar do absurdo, um
aluno bronco somasse velocidade com toucinho e apresentasse o resultado em
farófias. Mas este é, tão-só, o aspecto mais gritante de um conjunto de outros
que atropelam a lei ou expõem a imbecilidade de quem os permitiu. Alguns
exemplos, para fundamentar: três professores colocados na mesma escola para
preencherem um lugar que nunca foi manifestado; professores do quadro retirados
do concurso de mobilidade interna, sabe-se lá por quem, que agora não têm
vínculo a escola alguma; ignorância discricionária de pedidos de renovação de
contratos; cursos de curtíssima duração e duvidosa qualidade, que podem valer
mais que décadas de experiência lectiva; fórmulas e subcritérios subtraídos ao
conhecimento de quem concorre; contactos feitos ao sábado e domingo à noite,
para telefones pessoais de directores, com ultimatos para que fornecessem, num
prazo de duas horas, dados de que poderia depender a vida profissional de
milhares de professores.
Com professores, directores e escolas em polvorosa e abundantes protestos
públicos de pais e autarcas, o país testemunhou um ministro em negação,
autocontente e ufano por ter um ano a “arrancar com normalidade”, aparentemente
inconsciente ante o desastre e doentiamente alheio ao desrespeito, que
personificou, pelos cidadãos, particularmente pelos muitos professores
desempregados, cuja vida gratuitamente destroçou. Este ministro, na noite
anterior ao cínico pedido de desculpa, ainda negava o erro. Este ministro
ignorou os pareceres da Associação de Professores de Matemática e da Sociedade
Portuguesa de Matemática, a que outrora presidiu e usou para criticar o que
agora faz, que classificaram o processo como opaco, ilegal e injusto. Este
ministro só afivelou um ar sofrido para reconhecer o erro que todos já tinham
visto quando no Parlamento, depois de tentar resistir, acabou vergado à pressão
justa de alguns deputados. Merece crédito? Merece que aceitemos a sua desculpa?
Não! Porque no momento em que a pediu, a ética trôpega por que se pauta borrou
irrecuperavelmente o que já era pífio: “Estão a assistir a uma coisa que não é
comum na História, que é um ministro chegar ao Parlamento e reconhecer a
responsabilidade por uma não-compatibilidade de escalas e um ministro assumir
que o assunto vai ser corrigido”, disse, sem se enxergar, sem a mínima noção de
que o maquiavelismo bacoco que acabava de usar afastaria qualquer resíduo de
tolerância por parte dos que o ouviam. Valesse a moral, emergisse uma réstia de
ética do pântano em que esbraceja e já teria cruzado a porta pequena de saída
de um mandato de vergonha, que só acrescentou novos problemas aos velhos, já
resolvidos, por ele recuperados em retrocesso inimaginável.
Que resta, depois disto? Reparar o possível. Mas o que chega não favorece o
prognóstico. O secretário de Estado Casanova de Almeida reitera o que Crato
disse, isto é, que nenhum dos professores beneficiados pelo erro será
prejudicado. Ora a questão é bem mais que deixar no lugar quem já lá está,
juntando outro, que devia estar. Trata-se de um erro sistemático, que origina
injustiças em cascata. Não é um mais outro. São muitos mais pelo meio e a
projecção que qualquer colocação indevida tem nas posições relativas de
concursos futuros. E insistem os governantes em desvalorizar o problema porque,
dizem, afecta 1% dos professores de que as escolas necessitam. Persistem, pois,
num dolo de comunicação e na má-fé. Porque escondem que falamos de um universo
de 40.000 professores e um terço de todas as escolas do país. Sejam
politicamente honestos, por uma vez: anulem o concurso e partam do zero,
publicando novas listas, que respeitem a lei e a matemática elementar; promovam
a divulgação, por grupo de recrutamento, escola a escola, dos subcritérios
utilizados; prevejam a possibilidade de corrigir candidaturas, porque ficam
conhecidas variáveis que antes foram omitidas. É demorado? Então usem como
critério único a graduação profissional dos candidatos. Mudem a disposição
legal que o impede, como tantas vezes já fizerem para fins bem menos
justificados."
In "Público" de 24.9.14
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