quarta-feira, 2 de julho de 2014

POEMA MEU, IN MEMORIAM- Sophia de Mello Breyner

Poema "In Memoriam"

PANTEÃO-PALAVRA
IN MEMORIAM
Sophia de Mello Breyner Andresen

Quando Sophia acordava,
___________________acordava o mar também.
Sentia-se incomodado com o peso das palavras
que o olhar da poetisa espalhava pelo Além.
Na praia de areia fina avultava a neblina
___________________que só ao nascer o sol, se via desaparecer.
E a espuma sobrecarregada não podia entender
___________________que as palavras pesadas, aos pés lhe iam bater.

Era a hora em que o denso ar respirava um fumo intenso de frias manhãs
com memórias vazias de sonho,
a confundir nervuras das ondas
empenhadas em guardar o aroma das flores orientais
retalhadas de suspiros das areias nacionais.

Pelo tempo fora,
os temporais deixaram nos areais,
despojos que as ondas varreram
como livro que largou as folhas
num Outono inclemente
que respeitou,
tão somente,
o fragor das verdades litorais.

E o mar, salgado de maresia da infância feita poesia,
encostava-se , maravilhado, aos velhos taipais da casa
pintados de um azul esverdeado…
______________________…e deixava segredos da magia dum mundo antigo
guardados numa concha-bilhete-de-identidade
a cheirar ao percurso das rotas da pátria-sem-fim.

É feliz,
o amanhecer nebuloso dos búzios a caminhar,
_____________________ com os pés alagados de poesia…

Um cipreste mais à frente, balouça na força do vento
____________________que limpa o chão de
____________________um canto sagrado
____________________a dar vida a um panteão.

Lá viverão palavras de mar e terra, de verdade e rectidão,
de paz no amor com que se beija uma rosa-flor,
do belo e do menos belo que o olhar poético abrangeu,
__________________ na vastidão
__________________de um verso-poema imerso
__________________numa Eterna Interrogação.

A Luz-Palavra encherá espaços da memória
que repousarão a contar a história da mimética convulsão de um olhar
para sempre acordado,
__________________ a vaguear por sobre o mar de uma nação.

Maria Elisa Rodrigues Ribeiro
Julho/014


Sem comentários:

Enviar um comentário