quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Artigo in www.publico.pt



ANTÓNIO GUERREIRO


O discurso tradicional dos movimentos e partidos ecologistas foi útil e eficaz num primeiro momento, mas revela-se hoje incapaz de fazer passar as pessoas à acção, diz Harald Welzer, autor de Guerras Climáticas


O discurso tradicional dos movimentos e partidos ecologistas foi útil e eficaz num primeiro momento, mas revela-se hoje incapaz de fazer passar as pessoas à acção. É a mudança imediata de práticas e hábitos que visa uma fundação chamada Futurzwei, criada em Berlim por um sociólogo, especia-lista na questão da violência social e autor de um livro-choque, publicado em 2008, intitulado Guerras Climáticas. Com esse livro, Harald Welzer desenhou os contornos das guerras do século XXI, não como um profeta do Apocalipse, mas como alguém que leu com atenção, e com conhecimento das dinâmicas sociais da violência, o que o nosso presente já deixa perceber






Não há futuro possível para a cultura actual do consumo e da produção de lixoHarald Welzer

Harald Welzer (n. 1958) é um sociólogo e psicossociólogo alemão, actualmente professor na Universidade de Flensburg. A sua obra tem incidido nas questões da violência social e da memória. É neste âmbito que se situam dois livros seus sobre o nacional-socialismo, um dos quais é um trabalho originalíssimo sobre arquivos que nunca tinham sido trabalhados e que consistem em conversas dos soldados alemães, presos pelos aliados, que desconhecem que as suas conversas estão a ser gravadas. Mas o seu trabalho de professor e investigador também se desenvolve noutro plano: o dos estudos sobre as consequências sociais das mudanças climáticas e as formas de violência que elas provocam. Enquanto autor de Guerras Climáticas (título original: Klimakriege, 2008), Welzer ganhou uma elevada reputação internacional. Esse livro de tonalidade apocalíptica anuncia as formas e as causas da violência que irão crescer ao longo deste século: a violência ligada às mudanças climáticas, a emergência em grande escala de um novo sujeito a que Welzer chama o "refugiado do clima" (o indivíduo que, submetido a catástrofes climáticas, vai tentar sobreviver noutro lugar; este tipo de refugiados ainda não foi devidamente categorizado), a luta pelo acesso aos recursos naturais cada vez mais escassos.

Harald Welzer esteve em Lisboa, recentemente, a convite do Goethe-Institut, para participar num colóquio - organizado também pelo Instituto Francês, que tinha como tema "Amizade e Política na Europa". Um atraso de algumas horas do avião fez com que tivesse chegado a Lisboa já depois de terminado o colóquio. Mas, no dia seguinte, fez uma palestra no Teatro Maria Matos (integrado assim na lógica de um programa que esta instituição, dirigida por Mark Deputter, desenvolveu este ano), onde apresentou um projecto de intervenção ecológica, em termos pedagógicos e sociais, de que é co-fundador, e que nasceu em Berlim. Chama-seFuturzwei, ou seja, Futuro II, nome de uma segunda forma gramatical do futuro, correspondente ao que nós chamamos "futuro anterior". Este texto resume o que foi dito nessa palestra e acrescenta-lhe partes de uma conversa-entrevista com Harald Welzer, para além de utilizar Guerras Climáticas como fonte.

Porquê esse nome, Futurzwei? Porque, diz Welzer, "a Fundação trabalha no sentido de construir um outro futuro, porque não há futuro possível para a cultura actual do consumo e da produção de lixo". Esse trabalho consiste em mobilizar e atrair pessoas, colectividades, empresas, instituições, em suma, aquilo a que se chama a sociedade civil, já que, garante o sociólogo, "nenhum governo quer verdadeiramente mudar o que quer que seja", e a protecção do clima "não releva exclusivamente das políticas do ambiente".

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